terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Coisas que Mentimos para Nós Mesmos - VIII

Hoje é dia de mostrar a timeline cara-de-pau.

O que é isso? Datas, pessoal! Simplesmente atenção às datas!

Esconder ou alterar uma sequência temporal é uma das formas mais insidiosas de "provar" argumentos, ou pior estabelecer nexos causais espúrios.

Infelizmente, a enorme maioria das pessoas não presta atenção nisto. Mas é remediável...

Há dois pontos a serem observados
  1. Existe uma sequência temporal? Há nexo causal entre possível causa e efeito?
  2. A sequência temporal faz sentido? Há tempo de menos ou tempo demais entre ação e reação?
Observando estes dois pontos já se elimina grande parte da argumentação histórica falaciosa. Vamos a um exemplo?

Este é bastante rechonchudo: a ditadura militar de 1964 e a guerrilha de esquerda que se seguiu.

Notem um detalhes: entre o golpe 04/1964 e a primeira "reação" em 07/1966 há um interstício de 2 anos! Já se perguntou por que?

Melhor ainda: se o regime era essa malvadeza toda, por que a demora de 2 anos até surgir uma reação? Quão realmente impopular foi o golpe de 1964 em 1964?

Sim, sim, houve alguma resistência ao golpe no Rio Grande do Sul, mas na realidade seu papel nem de perto chega ao nível das manifestações de guerrilha ocorridas depois.

A pergunta malvada permanece: quais os fatores que levaram a que a reação só ocorresse dois anos após o golpe? Responda a pergunta e provavelmente saberá um pouco mais sobre o Brasil de 1964 e de quebra mais sobre o Brasil dos últimos 30 anos...

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Mercadores de Dúvidas

Este é o título do livro que acabei de ler no domingo (18/12/11).

O livro tem um espírito não totalmente dissimilar ao deste blog. Ele trata de expor grupos de pressão que se valem de credenciais acadêmicas e de marketing jornalístico para fazer valer suas idéias, enquanto denigrem ou  incutem dúvidas sobre a argumentação oposta.

A diferença marcante está que estes grupos atacam sociedade científicas e cientistas bem estabelecidos e bastante sérios.

Ou pelo menos é o que o livro tende a ilustrar.

Na realidade, o livro sofre dos mesmos problemas que confronta. Há situações aonde os autores acusam os grupos de pressão de determinada ação, somente para páginas depois fazerem precisamente a mesma coisa.

Ainda assim, o livro é um tour de force. Há um website com mais informações a respeito aqui.

Mas há algo que é importante frisar: o livro ilustra como agenda políticas tendem a se superpor a questões científicas. Isto, ao contrário do que os autores tentam fazer parecer, não é privilégio de uma ou outra corrente ideológica. O problema real é que este tipo de atuação é comum para todas as causas em que há questões econômicas envolvidas (principalmente aonde há uma etiqueta de preço).

Podemos facilmente adaptar vários dos pontos levantados no livro sobre os mercadores da dúvida (assim chamados pois a função deles é levantar dúvidas sobre consensos científicos) para o caso mais conhecido no Brasil como o da Usina de Belo Monte.

Só que aí, os mercadores de dúvidas não pertencem ao espectro político da direita...

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Educação: Amostragem e Confiança

Já pensou em como descobrir algo usando amostragem?

Eu já pensei nisso na questão da educação. Como? Meu questionamento era descobrir quantas questões deveria ter uma prova.

Sim, isto mesmo. Podemos pensar na prova como um teste estatístico aonde através de um conjunto de experimentos (cada questão), tentamos descobrir o quanto o estudante sabe do assunto. Ou seja é um problema não totalmente dissimilar ao de saber quantas bolas de determinada cor existem em um saco cheio de bolas multicoloridas.

É uma simplificação? Claro, mas as similaridades são maiores que as diferenças. Então a pergunta é: quantas bolas eu tenho de tirar de um saco para ter uma idéia da proporção de uma determinada cor?

A resposta é que para ter uma resposta exata, você precisa tirar todas as bolas. Mas para ter uma resposta com determinada probabilidade o número pode ser substancialmente menor. E é esta a questão... O problema é bastante similar ao de determinar o número de espécies em ecossistema por amostragem.

Bem, isto pode ser visto como um problema de repetição de Bernoulli aonde você tem proporções de p bolas da cor que você está interessado e q=1-p bolas de outras cores. A questão interessante é você descobrir quanto é aproximadamente p dado N repetições (p+q)^N.

Vamos começar supor que a cor é branca com p=2/3. Se tiramos 3 vezes teremos como possibilidades:
  • 29.62% de chances de tirarmos 3 bolas brancas (p=1)
  • 44.44% de chances de tirarmos 2 bolas brancas e 1 bola não branca (p=2/3)
  • 22.22% de chances de tirarmos 1 bola branca e 2 bolas não brancas (p=1/3)
  • 3.7% de chances de tirarmos 3 bolas não brancas (p=0)
Isto dá 66.66% de chances de p estar entre 1/3 e 2/3 Vamos supor agora que tiramos 6 vezes:
  • 8.78% de chances de tirarmos 6 bolas brancas (p=1/6)
  • 26.33% de chances de tirarmos 5 bolas brancas e 1 bola não branca (p=5/6)
  • 32.92% de chances de tirarmos 4 bola branca e 2 bolas não brancas (p=2/3)
  • 21.94% de chances de tirarmos 3 bolas brancas e 3 bola não branca (p=1/2)
  • 8.32% de chances de tirarmos 2 bola branca e 4 bolas não brancas (p=1/3)
  • 1.65% de chances de tirarmos 1 bola branca e 5 bolas não brancas (p=1/6)
  • 0.13% de chances de tirarmos 5 bolas não brancas (p=0)
Isto dá 81.21% de chances de p estar entre 1/2 e 5/6. Em 36 repetições temos 89% de chance de p estar entre 0.55 e 077

Bem, dá para entender a idéia.

Só que no caso das provas queremos saber não o valor exato, mas a probabilidade dele ser menor que um determinado ponto. Por exemplo, se a proporção é 2/3, qual a chance de tirarmos menos do que p=0.5 por exemplo:
  • No caso de tirarmos 3 vezes esta chance é de 55.7%
  • No caso de tirarmos 5 vezes esta chance é de 10.0%
  • No caso de tirarmos 36 vezes esta chance é de 1.2%
O problema é naturalmente quando a proporção é 1/2, um pouco acima de 1/2 (por exemplo 0.51), ou um pouco abaixo de 1/2 (por exemplo 0.49). No caso de 0.51, se tirarmos 36 vezes, a chance de encontrarmos uma proporção abaixo de 0.5 é de 38.7% (naturalmente, a chance de encontrarmos uma proporção abaixo de 0.42 é 9.88%).

O problema em questão é que quando a proporção é próxima a 1/2, o número de experimentos necessários (que no caso poderiam ser consideradas questões independentes de uma prova aumentam de modo significativo). Isso significa que o número de questões independentes para ter resolução suficiente para distinguir uma nota 4 de uma nota 5 também aumenta.

Vamos a questão real: Dado que a nota real do aluno é 5, qual o número de questões necessárias para garantir com 99% de confiança que a nota obtida em uma prova (na realidade uma avaliação satisfazendo conceitos de aleatoriedade e independência de eventos), seja maior que 4.75?

Se fizermos uma aproximação gaussiana (considerando o limite de uma repetição de Bernoulli), chegamos que para satisfazer:
  • 0.25 precisamos de 2655 questões
  • 0.50 precisamos de  665 questões
  • 0.75 precisamos de 296 questões
  • 1.00 precisamos de 166 questões
  • 1.25 precisamos de 106 questões
  • 1.50 precisamos de 74 questões
  • 1.75 precisamos de 54 questões
  • 2.00 precisamos de 42 questões
  • 2.25 precisamos de 33 questões
  • 2.50 precisamos de 27 questões
  • 2.75 precisamos de 22 questões
  • 3.00 precisamos de 18 questões
  • 3.33 precisamos de 15 questões.
O que significa isso? Que do ponto de vista de escolha de questões aleatoriamente, uma prova com 100 questões dá pouco mais que uma resolução na nota de 1.29 pontos. Uma prova com 42 questões permite separar em quatro níveis: Superior, Médio-Superior, Médio, Médio-Insuficiente, Insuficiente. Já uma prova com 15 questões dá uma resolução de 1/3 (Superior, Médio, Insuficiente). Uma prova com 7 questões tem uma resolução próxima a 1/2 (Passa, Não Passa).

Mas o que realmente acontece? Bem, os professores acreditam na capacidade de resolução dos seus instrumentos de avaliação. Acreditam tanto que, em grande parte, atribuem capacidade de diferenciação entre alunos que os instrumentos não tem garantia de possuir. Uma prova com 7 questões (aleatórias e independentes) garante a resolução binária do passa-não passa, mas não é o instrumento para diferenciar alunos de rendimento superior, médio ou insuficiente. Para tanto é necessária uma prova de 15 questões aleatórias e independentes.

Como garantir uma avaliação isenta então? Primeiro é necessário um banco de questões independentes tratando do assunto em estudo. Depois é necessário que estas questões sejam escolhidas aleatoriamente. Se 7 questões forem escolhidas, será possível diferenciar os estudantes nas categorias Passa e Não Passa (ou Suficiente e Insuficiente). Se 15 questões forem escolhidas é possível diferenciar os estudantes em 3 categorias: Superior, Médio e Insuficiente. Com 42 questões é possível diferenciar os estudantes em 5 categorias (Superior, Médio-Superior, Médio, Médio-Insuficiente e Insuficiente).

Tudo isto é uma aproximação. Mas uma daquelas extremamente educada!

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Ler o livro que é bom ninguém faz...

Li uma versão do livro Privataria Tucana de Amaury Ribeiro Jr. Assim o fiz por pensar que antes de acreditar no que os outros falam, creio que é melhor verificar as informações da melhor forma possível.

Como verificar a informação da melhor forma possível consistia em ler o livro, então foi isto o que fiz.

O resultado foi revelador...

Não pelo conteúdo do livro em si, este já era mais ou menos conhecido de antemão. Também não foi pela multitude de documentos digitalizados que fazem parte do livro (cerca de 1/4 ou mais do livro são estes documentos).

O que foi revelador? A reação das pessoas. Sim, isto mesmo. Poderia dizer até: polarização de confirmação para todos os lados. E o melhor: suspeito fortemente que a enorme maioria sequer leu o livro.

Como posso dizer isto? Bem, eu li o livro e vendo o que as pessoas escreveram a respeito, fica claro que a enorme maioria não leu.

Em primeiro lugar, o livro trata essencialmente de lavagem de dinheiro - que não é propriamente lavagem de dinheiro, mas remessas para o exterior em paraísos fiscais. E mais ainda: não há prova de irregularidade nisto. Sequer há prova que o dinheiro enviado tenha alguma coisa a ver com as privatizações.

Em segundo lugar, o livro traz problemas na linha do tempo descrita. José Serra foi ministro do planejamento de 1995 a 1996, sendo que privatização que o livro foca ocorreu pelo menos dois anos após este período, justamente quando ele estava como ministro da saúde. Isto por si só complica a argumentação que Serra teve alguma coisa a ver com isso (e com os demais citados também). O que poderia ser relevante é a informação que Serra montou um grupo de arapongas quando ministro da saúde - só que aí fica a questão que o próprio autor poderia ser incluído na pecha de araponga.

Em terceiro lugar, por todo o livro sente-se a impressão palpável que o livro foi escrito com os objetivos de colocar o autor em uma luz favorável, atacar Serra e outras pessoas. O autor vez por outra esquece da "isenção jornalística" e parte para o ataque direto sem luvas. Certamente que vários dos políticos citados não são santos, e também me arriscaria a dizer que vários tem culpa no cartório. Mas o livro não deixa isso realmente claro e cristalino. Tudo é muito circustancial e pode ser interpretado justamente como apenas uma visão enviesada da questão.

Em suma, se o livro fosse base para montar um caso de polícia, qualquer juiz iria derruba-lo por inconsistência em dois ou três tempos.

Mas como aqui estamos interessados é nas mentiras que as pessoas contam, vou fornecer um pequeno roteiro de perguntas que podem atrapalhar o "papo cabeça" dos que não leram, mas dizem que sim:
  1. De que Serra é acusado no livro?
  2. De que Eduardo Jorge é acusado no livro?
  3. De que FHC é acusado no livro?
  4. Como o livro prova que a grana da privatização é a grana da lavagem de dinheiro?
  5. Qual é a relação do autor com orgãos de informação?
Isto deve bastar para fazer os mais afoitos pensarem um pouco em LER o livro antes de critica-lo ou elogia-lo.

Portanto meu conselho é: leiam o livro e tirem suas próprias conclusões. Mais uma vez: ler o livro é fundamental para ter opiniões embasadas

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Coisas que Mentimos para Nós Mesmos - VIII

Certamente sabemos quando uma política, ou ação faz efeito, não?

Bem, na realidade temos a tendência a torcer um tanto a realidade para fortalecer o que achamos. Não dá é claro para torcer demais antes de começar a mentir de verdade. Mas dá para torcer o suficiente para suportar uma dúvida razoável.

Exemplo? Lei Seca! Diminuiu o número de acidentes? Aumentou o número de acidentes?

A triste verdade é que não dá para ter certeza nem de um nem de outro. Como pode ser? Bom, os números podem ser suficientes para afirmar que não se pode afirmar.

Antes de chegar nisto temos de saber qual é o tamanho do problema. Se formos olhar pelas blitzes e notícias temos informações conflitantes. Mas pelos números dá para ver que algo entre 5% e 20% dos condutores abordados foi multada (p(dirigindo embriagado | abordado)).

p(dirigindo embriagado) = p(dirigindo embriagado | abordado)*p(abordado) + p(dirigindo embriagado | não abordado)* p(não abordado)

Se a abordagem for puramente aleatória (as chances de ser abordado e não abordado são iguais e dirigir embriagado e ser abordado são independentes - o que na realidade não é, então podemos considerar que p(dirigindo embriagado) é p(dirigindo embriagado | abordado). Dado que a maioria das Blitzes ocorre a noite, eu consideraria que 10% dos motoristas é um compromisso razoável com relação a dimensão do problema.

Muito bem, qual o percentual de acidentes que estes 10% poderiam causar? Teoricamente é muito alto, mas estamos interessados nos acidentes com vítimas.Bem, supondo alguns cenários eu diria que nestes casos extremos o tamanho do estrago teria o teto de 11%. Por que? Bom, de modo simples eu iria pelo número médio de envolvidos em acidentes (em Brasília isto é 1.1) - isto seria o fator multiplicador dos 10%. Então teríamos reduções de média de até cerca de 11% neste modelo.

Muito bem, mas como é que a realidade se comporta?:

Olhando a série histórica dos acidentes fatais temos que antes da lei seca a média anual era de 405 com desvio padrão de 31. Depois da lei seca a média ficou em 410 com desvio de 24.

Não é possível afirmar que houve diferença significativa! Mesmo uma variação de 11% cairia dentro de pouco mais do que um desvio padrão. Seria necessário um número suficientemente grande de amostras para se afirmar que houve uma variação significativa.

Aliás diga-se de passagem: a alteração de 405 para 410 está dentro do desvio padrão anual. Ou seja: não dá para afirmar que aumentou ou diminuiu!


Eu sei que não é esta a informação que gostaríamos. Mas é como as coisas são...

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

A ilusão e outras drogas



Saiu no Jornal de Brasília uma reportagem sobre a ligação entre os homicídios dolosos e o uso de drogas.

O primeiro parágrafo é bem definitivo:

"No Distrito Federal, mais da metade das vítimas de homicídios dolosos praticados com arma de fogo tinham traços de cocaína, maconha ou das duas drogas juntas circulando pelas correntes sanguíneas. Em um estudo denso e inédito, médicos-legistas e toxicologistas do Instituto Médico-Legal necropsiaram um universo de 470 corpos e o resultado foi emblemático: 235 vítimas (63%) haviam consumido drogas pouco antes de morrer."

Como o número da amostra dá margem para tanto, vou dizer que 2/3 das vítimas haviam consumido drogas antes de morrer. Em termos estatísticos isto significa que p(consumiu drogas| vítima de homicídio doloso) = 2/3. Naturalmente isto quer dizer que p(não consumiu drogas| vítima de homicídio doloso) =1/3.

A reportagem tende a elaborar mais sobre o assunto mostrando que:
p(consumiu várias drogas | vítima de homicídio doloso) = 1/3
p(consumiu cocaína e/ou derivados | vítima de homicídio doloso) = 1/4
p(consumou somente maconha | vítima de homicídio doloso) = 1/12

A priori, esta informação pode servir para estimar a probabilidade de ser vítima de homicídio doloso dado que é consumidor de droga. De modo clássico este valor é dado:

p(consumiu drogas| vítima de homicídio doloso)*p(vítima de homicídio doloso) = p(vítima de homicídio doloso | consumiu drogas) * p(consumiu drogas).

Segundo esta referência, no caso da cocaína é cerca de 3/100 (p(consumo cocaína) = 3/100). Como o p(vítima de homicídio doloso) é 22/100000, p(consumo cocaína | vítima de homicídio doloso) = 1/4 temos por Bayes:

1/4*22/100000=p(vítima de homicídio doloso | consumiu drogas)* 3/100

O resultado é um surpreendente 11/6000. Isto quer dizer que enquanto a chance de ser vítima de homicídio doloso no DF é de 1 a cada 5000 (11 a cada 50000), a de ser vítima de homicídio dado que é consumidor de cocaína é de cerca de 1 a cada 600 - ou seja é 10 vezes mais perigoso!

Claro que a chave disto é a estimativa de consumo de drogas. Se por acaso este número for 10 vezes maior (3/10), então o valor tende ao esperado sem o consumo de drogas (11 a cada 60000) - ou seja, o número de usuários é uma fração razoável da população.

Note que isto causa um problema moral:
  • Se supormos que o consumo de cocaína não afeta a probabilidade de ser vítima de um homicídio doloso, então uma parcela razoável da população (30%) deve estar consumindo cocaína.
  • Já ao supormos que o consumo de cocaína afeta a probabilidade de ser vítima de um homicídio doloso, então consumir cocaína deve aumentar significativamente a chance de ser esta vítima.
Encruzilhada difícil, não?

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A Média é Medíocre?




A resposta é nem sempre.

Antes de mais nada, a conotação negativa de medíocre é como chifre (uma coisa que colocam na nossa cabeça). Tem até nome para isso: superioridade ilusória.

Nada melhor que esclarecer algumas coisas antes. Primeiro: a diferença entre média e mediana. Tecnicamente, os dois são iguais para distribuições simétricas (com terceiro momento nulo). Este é o caso das distribuições normal e da uniforme.
Então enquanto a mediana divide a distribuição em pedaços iguais (50% - 50%), a média trata do meio do conjunto de dados. Como já foi dito, as duas coincidem no caso de distribuições simétricas.

Mas se a distribuição não for simétrica, a história é completamente diferente. Aí a média e a mediana não são necessariamente coincidentes e pode realmente haver mais de 50% acima da média (mas não 50% acima da mediana).
Vamos ao exemplo: seja uma distribuição discreta composta por 4 elementos. Cada um destes 4 elementos recebem uma "nota" que varia de 0 a 10. Sejam 2 elementos com nota abaixo de 5 e 2 elementos com nota acima de 5.
  • Caso 1: Conjunto de notas {1, 2, 8, 9} - Média 5.0 e Mediana 5.0
  • Caso 2: Conjunto de notas {1, 5, 7, 9} - Média 5.5 e Mediana 6.0
  • Caso 3: Conjunto de notas {4, 4, 7, 9} - Média 6.0 e Mediana 5.5
  • Caso 4: Conjunto de notas {1, 5.75, 6.25,9} - Média 5.5 e Mediana 6.0
  • Caso 5: Conjunto de notas {4, 4, 5, 9} - Média 5.5 e Mediana 4.5
Como a mediana divide a distribuição em dois pedaços iguais, então necessariamente 50% dos elementos serão maiores ou iguais a mediana e 50% serão menores ou iguais a mediana. O que os exemplos acima mostraram é que podemos ter mais de média e mediana diferentes (e por conseguinte, mais ou menos gente abaixo da média). Vejam os exemplos dos casos 4 e 5, no caso 4 temos 3 notas acima da média, mas 2 notas acima da mediana. No caso 5 temos 3 notas abaixo da média , mas duas notas abaixo da mediana.

Olhando este exemplo podemos afirmar: é possível ter 75% abaixo ou acima da média, mas nunca se pode se dizer isso com relação a mediana.

A diferença é sútil, mas suspeito que caímos na armadilha de acreditar que pensamos assim pela costumeira impressão de suspeitar que a distribuição é simétrica.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Coisas que Mentimos para Nós Mesmos - VII


Você sabe o resumo da coisa, ou a coisa inteira?

Perguntinha básica, mas importante! No frigir dos ovos, na maioria dos casos o que sabemos é apenas o resumo da coisa. E nisto a coisa pode ser uma nova teoria científica, um novo medicamento, uma possível pandemia, ou mesmo um novo estudo sobre algo relevante.

Isto quer dizer que só conhecemos a narrativa e não a história. A diferença entre os dois é que a narrativa é construída por um interlocutor (que pode ser um relator), e a história é uma coleção de figuras, fatos e números. A conexão histórica ainda precisa ser montada - preferencialmente por alguém de confiança e alguma isenção.

Vamos a alguns exemplos?

Considere o caso do famoso do efeito coriolis. Este efeito é usado para justificar que a água na pia gira em um sentido no hemisfério e no sentido oposto no outro hemisfério. Isto seria a explicação perfeita se não fossem dois pequenos problemas: o primeiro é que não é verdade que a água na pia gira num sentido em hemisfério e no sentido oposto no outro. E o segundo problema é que se colocarmos os números na força de coriolis no caso da pia veremos que a pequenas vibrações locais tem muito mais influência do que esta força.


Este é um exemplo em que conhecemos a narrativa e a confundimos com a história - ou seja, sabemos o resumo e achamos que entendemos o que está acontecendo.

Um outro exemplo é o mito de que beber corta o efeito de antibióticos. Este não é propriamente um mito, mas uma generalização exagerada do problema: na realidade algumas bebidas atrapalham os efeitos de alguns antibióticos. Como o problema é complexo, então ficamos com um resumo da coisa (álcool corta efeitos de antibióticos), ao invés da história completa (bebida A atrapalha antibiótico B). Algo similar ocorre com equipamentos emissores de energia eletromagnética e aviões.

Este blog tem vários exemplos de resumos furados que acabaram substituindo a história real (a questão do que determina das estações do ano, quantos meses há em um ano se há 4 semanas por mês e 7 dias por semana, que as velocidades de carros colidindo em sentidos opostos não se somam, entre outras coisas).

O fato é que é importante perceber a diferença entre conhecer a narrativa e conhecer a história. Conhecer a narrativa é apenas reproduzir o que outras pessoas dizem, mas conhecer a história é montar a SUA narrativa.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

O Mito da Soma de Velocidades

Você já deve ter ouvido falar da história que "colisão frontal entre dois carros a 100 km/h é equivalente a uma colisão entre um carro e uma barreira de concreto a 200 km/h".


Isso na realidade é falso. Primeiro vamos ver um vídeo que mostra exatamente que é falso. Depois vamos ver a física por trás.

Muito bem, agora vocês viram que a história é mito. Na realidade um modelo bem simples é o de uma colisão elástica unidimensional. As equações básicas são conservação de momento e conservação de energia.
Conservação de Momento:
\,\! m_{1}u_{1}+m_{2}u_{2}=m_{1}v_{1} + m_{2}v_{2}.
Conservação de Energia:
\frac{m_1u_1^2}2+\frac{m_2u_2^2}2=\frac{m_1v_1^2}2+\frac{m_2v_2^2}2.
Resolvendo estas equações temos dois conjuntos de soluções possíveis, sendo que a solução :
v_{1} = \frac{u_{1}(m_{1}-m_{2})+2m_{2}u_{2}}{m_{1}+m_{2}} , v_{2} = \frac{u_{2}(m_{2}-m_{1})+2m_{1}u_{1}}{m_{1}+m_{2}}
Então podemos substituir cada caso e ver o que acontece. No caso de objetos com mesma massa indo em direção oposta, o que acontece é uma troca de velocidades.

O que acabo de mostrar? Que você já sabia a resposta, mas nunca nunca parou para pensar a respeito.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Preste atenção quando argumenta...

Frequentemente entramos em discussões por um motivo ou outro. Talvez devido a natureza de confronto destas muitas discussões, por vezes caímos em armadilhas argumentativas.

Uma dessas é muito comum e terrivelmente fácil de ser seguida: mudança do tópico da discussão.

Um exemplo? Vamos dizer que você está discutindo com uma pessoa sobre a pontualidade da mesma - que digamos ser fraca. Então de repente, a discussão de repente envereda pela capacidade de cumprir as tarefas no tempo programado - que digamos ser forte.

Nesta mudança de tópico, a crítica a pontualidade se perde e claramente deixa de ter sentido. Mais ainda: ao trocar uma crítica em um ponto fraco, por outra em um ponto forte, muito provavelmente a razão da discussão fica perdida. E a mensagem também...

Então quando entrar em uma discussão ou debate há de se cuidar para não ser levado para campos desconhecidos.

Quais são as regras nesse caso? Não fuja do tópico em questão por mais tentador que isto pareça.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Inexorabilidade Histórica? Think again...

Já ouviu falar da tese da inevitabilidade histórica? Muitas pessoas utilizam este conceito de uma forma mais personalizada na forma do "o que tem que acontecer, acontece"

Mas será que os acontecimentos não dependem também de fatores aleatórios ou mesmo de decisões individuais de repercussão apenas dos envolvidos?

SE você acha que não, então eu peço que conheça Henry Tandey.

Em 1914, poupou a vida de um jovem cabo ferido na linha de batalha.
Conheça o cabo:

Parece familiar? Deveria...

Muito bem, pela decisão individual de um indivíduo tivemos toda uma série de eventos que no fim das contas moldou o mundo moderno.

Aonde esta a inevitabilidade agora?

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Coisas que Mentimos para Nós Mesmos - Parte VI

Que poder tem as figurinhas mal-feitas... Você já viu a figura abaixo?


A coisa na realidade não é bem assim....

Recebi um texto de um professor amigo meu, e o texto levanta um ponto muito importante: entendemos a informação que recebemos?

O ponto em questão é a distância do sol à terra. Como sabemos a órbita da terra é uma elipse. Mas, talvez muitos não saibam que o círculo também é uma elipse - cuja excentricidade é zero.

E no caso do sistema terra-sol, esta excentricidade é de apenas 0.017. Isto significa que esta elipse é quase um círculo (raio maior de 1.017 e raio menor de 0.983). Sério... estamos falando de algo assim:

Se compararmos com outros planetas, teremos diversas outras excentridades(Marte 0.09, Vênus 0.007,Júpiter 0.05, Saturno 0.06, Urano 0.04, Mercúrio 0.21).

Naturalmente, excentricidades próximas de zero fazem elipses próximas de círculos. E excentricidades próximas de 1 fazem elipses bem alongadas. No caso da terra, a elipse é muito próxima de um círculo...

O pior é que é bem óbvio, uma vez que se pense um pouco a respeito do assunto...

E nem vou falar que os planetas não estão plano definido pelo equador do sol... Ora bolas, nem vou falar que os planetas não estão em um plano comum...

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

A Catástrofe de Belo Monte

Os ânimos estão acirrados. Há vídeos na internet a favor e contra* a construção da usina de Belo Monte.

Então o que é a catástrofe de que falo no título: a construção ou seu impedimento?

Na verdade, não é nenhum dos dois. A catástrofe é que as meias verdades e mentiras estão dominando o debate. E como este blog trata exatamente destas questões, então vamos a elas.

O pessoal do consórcio montou um blog que explica muita coisa. Mas o problema é mais sério, pois a difusão de informação está sendo prejudicada por meias verdades - até levantadas pelo próprio site. Então para isto resolvi elencar 10 informações importantes acerca de questões relevantes sobre Belo Monte:
  • A primeira informação a se saber é nada é de graça. Belo Monte terá impactos ambientais e sociais. Alguns deles desconhecidos. Não se sabe sequer se serão positivos ou negativos para sociedade brasileira, embora se imagine que a usina trará mais desenvolvimento para região (o que para alguns é uma coisa ruim, e para outros é uma coisa boa).
  • A segunda informação a saber é que toda geração de energia tem um custo associado. Aliás se formos precisos na linguagem, o termo correto não é "geração de energia", e sim "conversão de energia". Energia advinda de usinas térmicas tem um determinado custo (R$ 143,00/MWh), energia advinda de usinas eólicas (R$ 148,00/MWh) também tem um custo e energia advinda de usinas solares também tem um custo (R$ 500,00/MWh).
  • A terceira informação é que não dá para prescindir da energia de Belo Monte. O custo de não ter a energia é muito mais alto do que o custo de tê-la. Mas também é importante saber que existem outros tipos de fontes de energia que poderiam ser usadas. A escolha pela energia hidrelétrica foi determinada por ser a alternativa de custo mais baixo. E quando falamos mais baixo, não é pouca coisa não (R$ 77,97/MWh).
  • A quarta informação é que quem paga o custo da energia é o consumidor. Isto é todos que usam energia elétrica. Como o sistema é compartilhado, o uso de energia com custo mais caro encarece para todos. Mas se isto não fosse feito seria impossível custear o sistema como um todo (e não apenas Belo Monte).
  • A quinta informação é que crescimento econômico e disponibilidade de energia elétrica barata estão correlacionados positivamente. Isto quer dizer que energia cara atrapalha o desenvolvimento econômico, e o mesmo pode ser dito da indisponibilidade.
  • A sexta informação é que Belo Monte foi sim debatido exaustivamente na sociedade. Há mais de 30 anos que se debate Belo Monte nos mais diversos foros. Já teve debates no congresso nacional, em conferências, em universidades... Com a presença de indígenas e sem a presença de indígenas. Infelizmente há quem ainda diga que "não houve debate" ou que "não foi debatido o suficiente". 
  • A sétima informação é que a lógica econômica é que geralmente determina escolhas do tipo de energia a ser utilizado. O uso de energias alternativas é substancialmente mais caro que as escolhas tradicionais, e isto irá certamente encarecer a energia no curto e médio prazo. Então estas energias são escolhidas quando, em geral, as escolhas tradicionais trazem um custo associado fora do razoável ou podem ser até impossíveis de implantar.
  • A oitava informação é que a radicalização gera radicalização. Ao se denominar as pessoas que pensam diferentes de "burros", "plays" ou "ecochatos" perde-se a oportunidade de identificar os pontos aonde há uma certa razão na argumentação do lado oposto.
  • A nona informação é que um vídeo de protesto, divulgação ou apoio tem que começar pelo princípio de que toda informação nele é precisa. Errar em um ponto pode ter o efeito deletério de minar outros pontos que sejam corretos. E ao contrário do que o vídeo contrário à construção diz, o parque nacional do Xingu não fica nem Pará ( e sim em Mato Grosso) e nem perto de Belo Monte. O que fica perto de Belo Monte é o município de São Félix do Xingu. Isto meio que estraga o "Você já foi a Amazônia?" do início do vídeo e levanta dúvidas sobre outros pontos.
  • A décima informação é que todas formas de "geração de energia" tem um impacto ambiental. A diferença é que sabemos o impacto de algumas delas, mas desconhecemos o de outras. Não há, repito, nada de graça. Tudo tem um custo associado - não se tira algo da natureza sem algum tipo de retorno
Talvez esta última informação fosse a mais importante.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Reconhecendo a calhordice


Preste atenção nesta imagem...

Os chavões "Pela Ética", "Fora Corrupto", "Justiça" e "Chega de Corrupção" são claramente mentirosos.

Sim... Isto mesmo. Se eles fossem reais, deveriam estar presentes nos dois casos da charge.

Então, nestes casos, estes chavões eram apenas uma forma "ética" de acusar o adversário de ser bandido. Se o adversário era bandido ou não, isto era o menor dos detalhes...

Este comportamento é conhecido como assassinato de caráter. E pode ser encontrado em membros de todo espectro político.

Mas é importante reconhecer quem levanta estas bandeiras apenas quando convém...

São calhordas mesmo...

Mas talvez eu esteja sendo muito duro, ou não?

Hummm...Não creio

Se as "virgens vestais" da moral superior admitissem os seus erros... Aí talvez o comportamento pudesse ser perdoado. O duro é que não é como funciona...

O que acontece? Quando os calhordas, ou os que estes apoiaram são pegos de calças curtas, então há um roteiro previsível: negação, acusação do acusador e por fim "todos fazem isto".

Felizmente há variações: no caso do governador de Brasília temos que "palavra de um governador de Estado já é, por si, uma prova"(believe it or not)

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Coisas que Mentimos para Nós mesmos - Parte V

Escorregadio como gelo.

A expressão é bem conhecida. Mas sabia que não entendemos direito porque o gelo é escorregadio? Aliás, a pergunta certa é o que faz o gelo ser escorregadio?

Curiosamente, a explicação que se encontra nos livros mundo afora está errada. Isto pode ser visto em detalhes aqui. Um ponto bizarramente interessante é que teoria mais antiga parece estar sendo reabilitada.

O que isso nos diz?

Bom, parte do nosso "conhecimento" é na realidade um credo de segurança. O que é isso? De modo simples são informações que acreditamos como verdadeiras, mesmo com evidências em contrário. Eu encontrei este belo insight em uma crônica de Isaac Asimov.

Isto também é conhecido como Efeito Forer. Uma explicação mais detalhada pode ser encontrada aqui.

Mesmo na ciência o efeito Forer faz das suas. Podemos identificar explicações "científicas" que na realidade estão bem equivocadas (como por exemplo, que o inverno e verão são causados pela variação da distância até o sol - o que é falso).

O gelo escorregadio é só mais uma dessas coisas. E ainda por cima é possível verificar que a explicação encontrada nos livros era matematicamente errada...

Então esta é mais uma daquelas coisinhas que achamos que sabemos, mas na verdade estamos mentindo para nós mesmos.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Transformações

Vi um post no Facebook perguntando se alguém realmente entendia o que era a transformada de Fourier.

Eu vou mais longe: o que é uma transformada afinal de contas? Bem, creio que a pergunta mais correta seria: O que é uma transformada integral?

Na realidade é uma forma de reescrever uma função em outro domínio. Por que? Bom, existem uma variedade de motivos, mas o mais imediato é a idéia que é mais fácil resolver o problema em outro domínio do que no domínio original.

A forma geral de uma transformada é essa:
 (Tf)(u) = \int \limits_{t_1}^{t_2} K(t, u)\, f(t)\, dt
Podemos resolver ou equacionar o problema de forma diferente no domínio definido pelo núcleo da transformada K(t,u) e depois retornar com a resposta ao problema ao domínio original utilizando uma transformação inversa.
 f(t) = \int \limits_{u_1}^{u_2} K^{-1}( u,t )\, (Tf(u))\, du
Existem várias transformadas. O seu uso vai depender de que tipo de problema estamos interessados em resolver. Isto define o domínio a ser escolhido.

Claro que esta escolha pode simplificar ou complicar o problema a ser resolvido. Idealmente, a escolha deveria simplificar o problema. Mas para tanto é necessário definir bem o núcleo.

No caso de problemas que envolvam equações diferenciais a coeficientes constantes, o núcleo mais interessante é a função exponencial. O uso de transformações com este núcleo transforma a equação diferencial em uma equação algébrica (no caso em um polinômio).

Em outros casos, outros núcleos são mais interessantes.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Coisas que Mentimos para Nós Mesmos - Parte IV

Você acredita que nossa ciência avançou? Bem, você está certo nisso. E naturalmente, com estes avanços temos oportunidades de tomar decisões mais bem informadas que podem melhorar os resultados.

E você sabe quais são estes avanços?

Talvez seja melhor reformular  a pergunta...

Você que está informado corretamente sobre estes avanços?

Bem, aqui há uma série de problemas. A maior parte destes resulta em uma incompreensão do que ciência realmente é. Ao contrário da crença, ciência não é simplesmente jogar uma tese fora em benefício de uma melhor.

Existe um processo evolucionário em curso. Novas teorias, novas idéias, novos testes e novos resultados. Mas  a situação é bem mais complicada do que se pode entender apenas lendo notícias nos jornais ou mesmo em alguns periódicos. E para piorar, por vezes os próprios jornalistas ou repórteres tem uma noção pouco clara sobre o assunto a ser esclarecido...

Talvez seja melhor entender isto de outra forma...

Da mesma forma que em um processo evolucionário biológico, podemos entender o avanço da ciência como uma competição de idéias. E da mesma forma que um processo evolucionário, eis que estratégias surgem ao longo do caminho.

Claro que nem sempre as estratégias são belas e cheirosas. Alguns exemplos podem ser vistos nesta palestra TED.


Então, temos de ficar duplamente em alerta para notícias científicas em publicações leigas, e mesmo até nas profissionais

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Televisão no seu melhor IX

Hoje é dia dos The Avengers. Aqui temos o primeiro episódio:

Aqui temos um episódio com Cathy Gale:

e por fim temos um episódio com a extraordinária Emma Peel.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Subserviência: Jabuticaba ou Banana?

Na semana passada (10/11/11) aconteceram dois fatos insólitos na cúpula do G-20 em Cannes.

O primeiro fato é bem interessante:
A conversa em seguida tratou de Benjamin Netanyahu, o primeiro-ministro israelense. Certos de que não eram ouvidos, os dois presidentes se soltaram. “Eu não posso nem vê-lo, é um mentiroso”, disse Sarkozy. “Você está cansado dele, mas eu… eu tenho que tratar com ele todos os dias!”, retrucou Obama
Este fato por si só é bastante embaraçoso e diplomaticamente delicado (suspeito que Netanyahu já tinha conhecimento da opinião tanto de Obama como de Sarkozy).

Mas o segundo fato é que talvez seja mais digno de nota ainda:
Mais espantoso do que o tom cabeludo do papo presidencial entre dois tradicionais aliados de Israel foi o comportamento cúmplice da grande imprensa, que se mostrou uma aliada ainda mais incondicional de Sarkozy e Obama. Esta conversa aconteceu numa quinta-feira (3/11), numa sala reservada do suntuoso Palais des Festivals de Cannes, e foi ouvida casualmente por seis jornalistas de grandes órgãos internacionais, que ainda testavam seus fones de ouvido. Um deles era da Associated Press (AP), uma gigantesca agência de notícias que abastece 1.700 jornais e 5.000 rádios e TVs em 120 países. Outro era da Reuters, a maior e mais antiga agência do mundo, com 14 mil funcionários falando 20 idiomas em mais de 200 grandes cidades do mundo. Apesar disso, ninguém ficou sabendo da conversa ouvida por acaso pelos jornalistas simplesmente porque os jornalistas ocultaram a notícia

O que isto indica? Que há uma certa cumplicidade pelo menos entre as agências de notícia e os "donos do poder".

Mais ainda: mostra que falta isenção por parte destas agências. Segundo o OI, se não fosse a Arrêt sur images, nós sequer saberíamos deste acontecido.

O que isto nos ensina? Que a subserviência e falta de isenção do chamado quarto poder aos demais não é como a jabuticaba... Esta mais para banana.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Gênios científicos são controversos?

A resposta é provavelmente um forte "sim". Este é o tema de um artigo interessante que encontrei por acaso.

Mas o foco deste post está mais ligado a percepção.

Se definíssemos a chance de um gênio científico ser controverso, poderíamos utilizar a a linguagem das probabilidades:

p(controverso | gênio científico) - a probabilidade de ser controverso dado que é um gênio científico. Eu, como o autor do artigo que mencionei, também diria que esta probabilidade beira os 90%.

Mas e o contrário?

p(gênio científico | controverso)? Em outras palavras, a probabilidade de ser um gênio científico dado que é controverso. Ah, aí eu suspeito que esta probabilidade é bem pequena (chutaria por volta de 0.1% ou menos).

Creio que isto torna o problema claro: temos a infeliz tendência de confundir p(gênio científico | controverso) com p(controverso | gênio científico). E nada poderia estar mais longe da verdade, pois segundo o teorema de Bayes:

p(controverso|gênio) * p(gênio) = p(gênio | controverso)* p(controverso)

Substituindo os números temos:

900*p(gênio) = 1*p(controverso), ou seja é 900 mais provável ser controverso do que gênio.

Naturalmente, nós as duas coisas confundimos até dizer "chega".

Mas não é esse caso apenas... Suspeito que muitas das generalizações preconceituosas boas ou más levem uma pitada deste tipo de confusão.

Eu volto a esse ponto em posts futuros (a foto que ilustra este post é, não por acaso, de Alfred Wegener)

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Ferramenta útil

Lendo uma matéria sobre o caso William Waack tive uma grata supresa. O mesmo disponibilizou um link para pesquisa nos documentos divulgados.

Posso recomendar algumas pesquisas? Sugiro Brizola, Marina Silva, Jose Dirceu, Marcio Thomaz, Elio Gaspari, Minc, etc...

Tem coisas bem interessantes

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Coisas que Mentimos para Nós Mesmos - Parte III

Gosto de imaginar que sou racional, mas suspeito que a verdade é substancialmente mais complexa.

Vamos a um experimento. Suponha que eu esteja vendendo uma assinatura de Exame (ou Veja, ou Carta Capital, ou o que seja). As opções são as seguintes

  • Assinatura eletrônica - R$ 50,00/ano
  • Assinatura em papel - R$ 100,00/ano
  • Assinatura eletrônica e em papel - R$ 100,00/ano

Qual dessas opções você escolhe? Veja agora a seguinte palestra:

E agora eu apresento uma nova situação

  • Assinatura eletrônica - R$ 50,00/ano
  • Assinatura eletrônica e em papel - R$ 100,00/ano

O que mudou da situação anterior?

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Sistema Universal de Saúde

Esta é a sigla do SUS. No mundo inteiro existem diversos serviços universais de saúde. O fato é que os serviços universais custam por volta de 8 a 11% do PIB. No caso do Brasil, o valor chega perto de 8% do PIB.

Para saber o quanto é isso é necessário fazer um comparativo entre países. O PIB do Brasil é de cerca de US$ 2 Trilhões. Os 8% disso são US$ 160 bilhões. Este seria aproximadamente o gasto com a saúde anual. Dividindo isto pela população (200 milhões) teremos cerca de US$ 800,00/ano.

Comparando com os demais países (faixa de US$ 2500,00 a US$ 4000,00 por habitante a cada ano), temos que nosso gasto é 1/3 dos demais países. Além disso temos cerca de metade nos médicos (1.4 para cada 1000 pessoas - comparados com as faixas de 2-4 médicos por 1000 pessoas do restante dos países). E um número irrisório de enfermeiras comparadas aos demais países.

No entanto é interessante notar que os custos do sistema universal de saúde vem aumentando com o tempo.

E isto é perfeitamente natural: a medida que a idade média da população vai aumentando, os custos vão naturalmente aumentando (se a expectativa de vida aumenta e as taxas de natalidade permanecem constantes, então a idade média aumenta).

Então o sistema de saúde tem alguns dilemas. Em um sistema estacionário, os gastos e receitas não crescem. Mas em um sistema dinâmico os gastos e receitas variam com o tempo. Se as receitas aumentarem em relação aos gastos o sistema é superavitário, mas se ocorrer o contrário o sistema passa a ser deficitário.

No fundo o sistema funciona com a seguinte premissa: não pode todo mundo ficar doente ao mesmo tempo. Há uma limitação intrínseca entre a razão pessoas doentes/pessoas não doentes. Quanto menor for este número, mais folga o sistema tem para operar.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O Raciocínio é meu e ele vale até aonde eu quiser

Ah, se fosse assim... Este é um dos grandes problemas com falácias lógicas: se você esticar o argumento até sua conclusão lógica, ele mostra sua cara feia.

É bem possível que vários leitores irão se chatear com o que eu vou fazer agora. E o que vou fazer? Vou pegar uma proposta de um conhecido político (Projeto de Lei 480/2007) e vou esticar o raciocínio até seu desenlace lógico.

Quem for passível de encontrar ofensa, peço que deixe o restante deste post para lá.

A justificativa do projeto é a seguinte:


No Brasil, os filhos dos dirigentes políticos estudam a educação  básica em escolas privadas. Isto mostra, em primeiro lugar, a má qualidade da escola pública brasileira, e, em segundo lugar, o descaso dos dirigentes para com o ensino público.Talvez não haja maior prova do desapreço para com a educação das crianças do povo, do que ter os filhos dos dirigentes brasileiros, salvo raras exceções, estudando em escolas privadas. Esta é uma forma de corrupção discreta da elite dirigente que, ao invés de resolver os problemas nacionais, busca proteger-se contra as tragédias do povo, criando privilégios.


Além de deixarem as escolas públicas abandonadas, ao se ampararem nas escolas privadas, as autoridades brasileiras criaram a possibilidade de se beneficiarem de descontos no Imposto de Renda para financiar os custos da educação privada de seus filhos.


Pode-se estimar que os 64.810 ocupantes de cargos eleitorais – vereadores, prefeitos e vice-prefeitos, deputados estaduais, federais, senadores e seus suplentes, governadores e vice-governadores, Presidente e Vice Presidente da República – deduzam um valor total de mais de 150 milhões de reais nas suas respectivas declarações de imposto de renda, com o fim de financiar a escola privada de seus filhos alcançando a dedução de R$ 2.373,84 inclusive no exterior. Considerando apenas um dependente por ocupante de cargo eleitoras.


O presente Projeto de Lei permitirá que se alcance, entre outros, os seguintes objetivos:


a) ético: comprometerá o representante do povo com a escola que atende ao povo;


b) político: certamente provocará um maior interesse das autoridades para com a educação pública com a conseqüente melhoria da qualidade dessas escolas.


c)  financeiro: evitará a “evasão legal” de mais de 12 milhões de reais por mês, o que aumentaria a disponibilidade de recursos fiscais à disposição do setor público, inclusive para a educação;


d) estratégica: os governantes sentirão diretamente a urgência de, em sete anos, desenvolver a qualidade da educação pública no Brasil.


Se esta proposta tivesse sido adotada no momento da Proclamação da República, como um gesto republicano, a realidade social brasileira seria hoje completamente diferente. Entretanto, a tradição de 118 anos de uma República que separa as massas e a elite, uma sem direitos e a outra com privilégios, não permite a implementação imediata desta decisão.


Ficou escolhido por isto o ano de 2014, quando a República estará completando 125 anos de sua proclamação. É um prazo muito longo desde 1889, mas suficiente para que as escolas públicas brasileiras tenham a qualidade que a elite dirigente exige para a escola de seus filhos.


Seria injustificado, depois de tanto tempo, que o Brasil ainda tivesse duas educações – uma para os filhos de seus dirigentes e outra para os filhos do povo –, como nos mais antigos sistemas monárquicos, onde a educação era reservada para os nobres.


Diante do exposto, solicitamos o apoio dos ilustres colegas para a aprovação deste projeto.


Pois bem, parece uma boa idéia? Troque as palavras EDUCAÇÃO por SAÚDE e ESCOLA por HOSPITAL.

Ainda parece uma boa idéia? Hummm, suspeito que não... E o entendimento foi este mesmo pelo relator.

É terrível quando levamos as idéias a sua conclusão lógica e vemos que o buraco é mais embaixo, não?

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Infotenimento - chegamos lá, afinal...

A palavra é o neologismo, advindo do termo em inglês infotainment. O que significa é justamente uma edição de conteúdo de modo a realizar uma combinação de informação com entretenimento.

A característica principal desta nova modalidade é o ritmo, a edição e o foco na completude com superficialidade. Em poucas palavras: as notícias são transformadas em uma forma de diversão. A profundidade na análise, a apresentação de diversos pontos de vista - tudo isso vai para o segundo plano.

Curiosamente, este tipo de veiculação de notícias já vinha sendo criticado de uma forma ou de outra em meios como o cinema.


Se você não conseguiu perceber a diferença do que foi apresentado para o que você vê normalmente na televisão, então você já está vivendo a era do infotenimento há tempos

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Coisas que Mentimos para Nós Mesmos - Parte II

E vamos a mais um exemplo de que a nossa arrogância pelo conhecimento por vezes não se justifica.

Um outro exemplo é que não sabemos direito o que é o magnetismo. Temos uma boa idéia de como ele funciona, temos um bom conhecimento de como utilizá-lo. Mas a verdade é que não sabemos direito como é que ele é, e sequer se um magneto permanente é realmente permanente.

Existem diversos modelos e teorias. E é isto que há! Os modelos clássicos deram lugar aos modelos quânticos, mas a verdade é que ainda são modelos. Mas claro que o lado positivo é que estes "novos" modelos são muito mais poderosos do que os anteriores.

Para efeito de utilização, o que sabemos sobre o magnetismo já permite fazer muito. E para a enorme maioria destes casos, o modelo clássico até que é um bom ponto de partida. Ele permite explicar praticamente todos os fenômenos macroscópicos com razoável precisão.

Mas há uma série de questões complicadas que atrapalham esta visão.

A maior delas é justamente a questão do campo magnético planetário. O modelo é que correntes elétricas no núcleo externo dão origem ao campo. Mas há uma série de problemas, um dos mais complicados é justamente que campos magnéticos tendem a desaparecer com o aumento da temperatura. Este efeito tende a se contrapor a idéia de um magneto permanente no interior da Terra.

Então o que sobra? Correntes circulando! No caso, estas correntes são cargas em movimento constituindo enlaces fechados no interior da Terra. E de onde vem estas cargas? Ninguém sabe...

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Lula, o SUS e uma Fábula

Estão voando na internet comentários sobre a doença do presidente Lula. Há pérolas sobre o assunto de todos os lados. E realmente eu preciso comentar algumas delas. Só que antes disso quero deixar claro neste post a minha opinião sobre o assunto.

A melhor forma de fazer isto é com uma fábula:

Primeiro em Verso
Conta tradição antiga
Que um velho camponês
Precisando de dinheiro
Em certa altura do mês
E manda o filho caçula
Buscar o burro ou a mula
Para vender dessa vez


O menino vem ligeiro
Trazendo o belo burrinho
Seguiram os três pra cidade
Logo de manhã cedinho
Ninguém montou no animal
Pra ele não dar sinal
De cansaço do caminho


Porém numa feia curva
Daquela feia estrada
Viram feio viajante
Que falou: - “Que “besteirada”!
O animal vai vazio
E o pobre velho senil
Vai a pé na caminhada”


- “Vejam, só, que grande asneira
É promessa ou penitência?”
E o velho lhe deu razão
Dado a sua obediência
E foi no burro montando
E o menino foi puxando
Na mais pura inocência


E foi dizendo o velhote
- “Só assim ninguém reclama
E tapo a boca do mundo!”
Sem saber que o mundo trama
Logo à frente as lavadeiras
Lavando nas corredeiras
Gritaram: - “Mas que burrama!”


- “Um marmanjão com saúde
Muito contente montado
E um pobre menininho
Puxando o burro! Ah, malvado!...
Este mundo está perdido
Desça daí seu bandido
Que o menino está cansado!”


Depois dessa, o pobre velho
Indignado acenou
E na garupa do burro
O seu menino montou
E disse ali sem demora:
- “Quero ver quem fala agora!?”
E o seu caminho tomou


Mas não deu nem dez minutos
Desponta ali na frente
Montado na bicicleta
Um roceiro e diz: - “Oxente!
O pobre desse animal
Não vai chegar ao final
Com esse peso em dia quente!”


Disse isso e foi-se embora
E o velho concordando
Desce, deixando o menino
E sai na frente puxando
Mas encontra outro sujeito
Que ao menino curva o peito:
- “Majestade!” O vai saudando.


Logo pergunta o menino:
- “Por que falas: majestade?”
- “Porque somente os príncipes
Tem servo na tua idade
Puxando as montarias
Não fosses rei não terias
Lacaio à tua vontade!”


- “Lacaio, eu?” – Diz o velho
- “Mas que grande desaforo!”
Desça ligeiro menino
Pra não ouvir este coro
Vamos com o burro nas costas
Pra ver se o mundo assim gosta
E não faça mais agouro


E os dois com o burro nas costas
Qual estranho ritual
Encontram alguns rapazes
Que fazem tal carnaval
Gritando: - “Vejam três burros
Só falta soltarem zurros
Quem é o mais burro afinal?”


E o velho grita: - “Sou eu!
Burro de orelha também
Querendo escutar o mundo
Sendo aconselhado além
Quem segue o mundo maluco
Vai morrer doido e caduco
Sem nunca agradar ninguém!”


Depois em prosa:
Um velho resolveu vender seu burro na feira da cidade.Como iria retornar andando, chamou seu neto para acompanhá-lo. Montaram os dois no animal e seguiram viagem. 

Passando por umas barracas de escoteiros, escutaram os comentários críticos; " Como é que pode, duas pessoas em cima deste pobre animal !". 

Resolveram então que o menino desceria, e o velho permaneceria montado. Prosseguiram... 

Mais na frente tinha uma lagoa e algumas velhas estavam lavando roupa. Quando viram a cena, puseram-se a reclamar; " Que absurdo ! Explorando a pobre criança, podendo deixá-la em cima do animal." 

Constrangidos com o ocorrido, trocaram as posições, ou seja, o menino montou e o velho desceu. 

Tinham caminhado alguns metros, quando algumas jovens sentadas na calçada externaram seu espanto com o que presenciaram; "Que menino preguiçoso ! Enquanto este velho senhor caminha, ele fica todo prazeroso em cima do animal. Tenha vergonha !" 

Diante disto, o menino desceu e desta vez o velho não subiu. Ambos resolveram caminhar, puxando o burro. 

Já acreditavam ter encontrado a fórmula mais correta quando passaram em frente a um bar. Alguns homens que ali estavam começaram a dar gargalhadas, fazendo chacota da cena; " São mesmo uns idiotas ! Ficam andando a pé, enquanto puxam um animal tão jovem e forte !" 

O avô e o neto olharam um para o outro, como que tentando encontrar a maneira correta de agir. 
Então ambos pegaram o burro e o carregaram nas costas !!! 

Depois em vídeo:

Então a lição é a seguinte: Caro Lula, trata-se da melhor forma que puder, do modo que desejar e sem dar ouvidos a todas as opiniões. O mais importante é superar esta dificuldade.

E o meu desejo é que fique bom logo.