quinta-feira, 28 de abril de 2011

E se der errado?

Miriam Belchior disse em entrevista: "As medidas que forem necessárias nós tomaremos, mas não arriscaremos deixar de crescer. Em outros momentos da historia brasileira, em função do crescimento da inflação, se deu um remédio que matava o doente. Nós não queremos matar o doente, mas dar um remédio que faça com que ele fique são". Eu discordo desta análise

Dado o que já aconteceu antes, a troca de crescimento por inflação acaba sendo péssimo negócio. Durante o período de 1969 a 1973 o Brasil chegou a patamares de crescimento na faixa de 7% ao ano. A inflação não se fez de rogada e cresceu também.

No ano passado a inflação foi a 5,91% e o crescimento de 7,5%. No fundo há razões não ligadas diretamente ao crescimento, mas aos efeitos desse crescimento que podem tirar a inflação de controle.

Uma dessas razões é justamente o mecanismo de freio da inflação é o aumento da taxa de juro Selic. Infelizmente, a taxa de juro está ligada à dívida pública. Como 12% dos credores da dívida pública são estrangeiros, então eles podem se valer de diferenciais do câmbio e aplicações da dívida para ter lucro. Isto acontece quando o dólar está "barato".

Parece que 12% não é muito, mas o problema é que uma variação de 12% anual da dívida pública é algo na vizinhança de R$ 140 bilhões. E isto pode ser sim um problema.

Outra questão é que o crescimento trás efeitos de saturação em uma infra estrutura que não teve investimentos suficientes: aumentam o número de carros, consumo de combustíveis, compras de bens de primeira necessidade e supérfluos, bem como da capacidade de compra e subseqüente tolerância a patamares mais altos de preço.

De 2009 a 2010, o número de carros aumentou em cerca de 6 milhões (ou seja 10% do total), o que também causou um aumento no consumo de combustíveis de cerca de 8% (a gasolina teve um aumento de quase 20%). Então é de se esperar que haja problemas nessa equação.

No ano de 2010 foram vendidos cerca de 118 milhões de metros cúbicos de combustível (cada metro cúbico tem 1000 litros). Dividindo este valor pelo tamanho da frota de aproximadamente 65 milhões de veículos temos cerca de 1.815 metro cúbico (ou 1815 litros) por veículo.

Em 2009 foram 109 milhões de metros cúbicos. Dividindo-se este valor pela frota de 59 milhões temos 1847 litros por veículo. Se considerarmos os arredondamentos teremos cerca de 1800 litros por ano para cada veículo adicional incluído na frota.

Infelizmente, aumentar a frota em também implica em aumentar o consumo. E a relação em si não é simples devido ao fato que ao falarmos de combustíveis estamos incluindo todos em um balaio de gato - não é apenas o caso da gasolina.

Como aumento na demanda de combustíveis, carros e etc causam necessidade de outros aumentos, as chances são de crescimento inflacionário

E isto é pode ser um grande problema.

Sobre meus pés, meus calos e os pés dos outros

No último post mencionei sobre a questão do meu sentimento que a UnB está tomando rumos equivocados tendo as melhores das intenções como objetivo.

Talvez alguns perguntem: por que você não faz nada? Bem, eu estou fazendo. Não estou diretamente me contrapondo a situação, mas estou indicando como enxergo o estado das coisas. Outros podem escolher verificar se as coisas realmente estão do modo que vejo ou não...

Talvez aí perguntem: mas você não vai fazer nada? A resposta honesta é realmente não sei. Não, isto não é covardia (se fosse covardia eu sequer haveria escrito o que escrevi). É simplesmente paralisia devido a incerteza de qual é o curso de ação que causa o mal menor.

Tudo é realmente muito complicado, até mesmo o que é bom e mal. A clareza desta distinção nem sempre é fácil (eu a enxergo em algumas situações), mas já percebi que as conseqüências sobre ações desse tipo podem muito bem ser o reverso do que se espera.

Este tipo de problema é bem conhecido com o custo do controle: o custo do controle de um sistema pode escalar até tornar o funcionamento do sistema inviável (aqui no Brasil isto é batata).

No caso particular da UnB, temos uma série de problemas que foram catalisados justamente pela análise simplista de como proceder. Escolheram-se cursos de ação e BUM, deu tudo errado!

Eu poderia discorrer sobre o idealismo imbecil, a politicagem, as análises de umbigo e muito mais. Mas nada disto iria melhorar ou sequer resolver a situação.

Prefiro acreditar (tolamente) que mostrando o erro, as pessoas irão corrigir o erro.

É uma crença otimista e absolutamente ingênua. A diferença é que eu sei disso.

É lícito fazer algo errado para fazer algo bom?

A resposta ética: não! A resposta pragmática: se for para o bem maior! A resposta verdadeira: desde que você não seja pego...

Infelizmente tem aparecido sinais que estão tomando decisões equivocadas na minha(?) universidade. Entretanto, tenho razões para acreditar que estas na realidade tem a melhor das intenções como motivo. Francamente isto me deixa em uma situação complicada, pois sei que há interesse em fazer coisas boas, mas os caminhos tomados são no mínimo equivocados.

As evidências são claras e não vou fazer o trabalho de conectar os pontos. Mas deixo algumas pistas: o problema da redução da jornada de trabalho, os custos da reconstrução causada pela inundação e o suposto corte de verba que ocorreu ou não...

Mas para mostrar como estas coisas são complexas, deixo aqui a história do mestre zen:

Em um pequeno vilarejo, um menino ganha de sua família um lindo cavalo. Ao verem o belo presente dado ao menino, todos à sua volta exclamam:
- Que maravilha!
E o mestre zen: Veremos...
Passa se algum tempo e o menino, ao andar com seu cavalo, cai e quebra a perna. Todos lamentam:
- Que desgraça!
E o mestre zen: Veremos...
Depois de alguns anos, o país entra em guerra, e todos os jovens do vilarejo são convocados para a luta e acabam morrendo, exceto o jovem com a perna enferma. Ao que a família conclui:
- Que maravilha!
E o mestre zen: Veremos...

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Ignorantia Legis Neminem Excusat

Em miúdos: Nínguém pode se eximir de cumprir a lei alegando o seu desconhecimento (Ignorância da Lei não é desculpa - em uma tradução mais literal).

Isso faz sentido? Faria, se o país não contasse com mais de 190 mil leis. Em virtude desse número fica difícil exigir o conhecimento das leis por especialistas, quanto mais de leigos comuns.

E isto é uma das faces mais cruelmente cômicas na nossa terrinha: como, em sã consciência, se pode exigir isto de qualquer cidadão? O próprio preceito não faz o menor sentido para a população do Brasil.

Isso está no próprio código penalArt. 21 - O desconhecimento da lei e inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminui-Ia de um sexto a um terço.

A pergunta óbvia é: isso faz sentido? a resposta óbvia é: não!

Esta contraposição às 190 mil leis (supondo que consigam os grafar 50 leis por página, estaremos falando de um volume de 3 mil e oitocentas páginas), como podemos exigir o conhecimento de todas?

Isso é bem nosso país...

Para que serve uma universidade? E isso é importante?

Uma das grande complicações a respeito de se ter um orçamento apertado é aonde gastar. Ou melhor: como gastar melhor...

Isto pode parecer simples mas está longe de ser uma decisão fácil. O ato de criar um orçamento implica em um planejamento e uma suposição de controle simplesmente dissociada da realidade. A verdade é que tirando o que é rotina, muito pouco pode ser efetivamente planejado com sucesso.

E nisto vemos um grande problema: como se monta um orçamento? Primeiro tem que ser otimista. Não dá para considerar que tudo que vai ser planejado vai ser furada. Mas também tem que ser pessimista. Não dá para acreditar que absolutamente tudo vai sair como o planejado.

A prioridade primeira é sempre manter a máquina funcionando (ou seja, preferencialmente fazer o que ela tem de fazer - ainda que em níveis mínimos). A outra questão é como melhorar e ampliar os serviços da máquina. Esta deve ser a segunda prioridade.

Só então vem as considerações do que seria prudente ter em reserva.

No caso de uma pessoa esta questão pode ser dividida de modo fácil: primeiro - habitação e alimentação. Ainda dentro da categoria "manter a máquina funcionando": saúde, transporte e lazer. Tudo calculado para o mínimo necessário.

A seguir vem os planejamentos: compromissos assumidos que necessitam de recursos para serem realizados (aí vem dívidas, por exemplo), compromissos a serem assumidos para futura melhoria da qualidade de vida (nova casa, carro, ou similares).

Se com isso ainda tem-se sobra pode-se melhorar a situação de "manter a máquina funcionando", ou então passar a poupar para eventualidades...

E em uma instituição?

A regra é mais ou menos a mesma: em primeiro lugar vem o que é absolutamente necessário para manter "a máquina funcionando". Depois vem possíveis compromissos já assumidos e melhorias na qualidade. Só depois disso é que devem vir os sonhos...

No caso de compromissos assumidos é fundamental que os recursos para os mesmos não sejam apenas eventuais, mas possuam programação fixa.

Por que toda essa novela? Porque é absolutamente fundamental ter como primeira prioridade ter a máquina funcionando. E para tanto tem que se saber exatamente o que constitui efetivamente "a máquina funcionar"

E aí vai boa parte do desperdício: desvio da função dos recursos.

Uma universidade serve para que afinal?

Se esta pergunta não tiver resposta então sempre vai existir desperdício.

sábado, 23 de abril de 2011

Medidas de Desigualdade

Já ouvi falar muito sobre a questão da desigualdade no país. E realmente ela existe, mas parece ser mais intrínseca ao sistema que premia quem tem melhor resultados do que propriedade intrínseca de um sistema particular.

Mas o ponto não é esse. O ponto é como mensurar desigualdade em particular. Como podemos dizer que uma situação é ou não desigual para um determinado grupo? Pode parecer óbvio, mas como veremos isto está longe de ser realmente assim.

Vamos considerar o relatório elaborado pelo LAESER: o Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil. Aos curiosos ele está todo aqui. Diversas reportagens anunciam e prenunciam a desigualdade.

O problema é que não é tão simples assim. Se a população fosse dividida igualmente entre brancos e negros a desigualdade seria identificada de modo mais fácil. E aí entre o velho problema do Teorema de Bayes:

p(X | pardo ou negro) é diferente de p(pardo ou negro | X)

E isto faz toda diferença. Felizmente podemos encontrar a relação real utilizando o próprio teorema:

p(pardo ou negro | X) = p(branco | X) * p(X | pardo ou negro) / p(X | branco) * p(branco) / p(pardo ou negro)

Esta relação permite estabelecer a desigualdade em termos mais reais, relacionando as taxas entre brancos e pardos ou negros. Quanto mais próximo de 1 for este valor, mas igual será a relação.

Vamos colocar números: a população branca no Brasil corresponde a 50% do total (aproximadamente), já a população negra corresponde a 7% e a parda a 42%. Então temos uma relação de 0.5 para 0.49

Neste caso a equação acima se torna:

p(pardo ou negro | X) = 1.02 * p(branco | X) * p(X | pardo ou negro)/p(X | branco)

Assim, por exemplo: em 2008 quase metade das crianças afrodescendentes de 6 a 10 anos estava fora da série adequada, contra 40,4% das brancas.

p(pardo ou negro | X) = 1.02 * p(branco | X) * 0.5/0.4 = 1.275 * p(branco | X)

Isto quer dizer que para cada 1000 crianças brancas fora da série adequada teríamos 1275 crianças negras ou pardas.

Outro exemplo:O estudo constata que o estabelecimento do SUS beneficiou mais pretos e pardos (66,9% da sua população atendida em 2008) do que brancos (47,7%), mas a taxa de não cobertura (proporção dos que não conseguem atendimento) dos afrodescendentes foi de 27%, para 14% dos brancos. 

p(pardo ou negro | X) = 1.02 * p(branco | X) * 0.67/0.48 = 1.424 * p(branco | X)

Isto quer dizer que para cada 1000 pessoas brancas beneficiados pelo SUS teríamos 1424 pessoas negras ou pardas.

p(pardo ou negro | X) = 1.02 * p(branco | X) * 0.27/0.14 = 1.967 * p(branco | X)

Isto quer dizer que para cada 1000 pessoas brancas não cobertas pelo SUS teríamos 1967 pessoas negras ou pardas.

Claro que o caveat aqui é simples: como as populações pardas ou negras tem tamanho comparável a dos brancos então os dados são mais ou menos intercambiáveis. Mas o que acontece se a população de pardos negros aumentar 10% (lembremos que esta população é definida com base em auto-declaração)?

Assim, a população negra ou parda passaria de 0.49 para 0.54 e a branca desceria para 0.45 e o nosso 1.02 passaria a ser  0.83.

De repente, sem mudar absolutamente nenhum indicador social, teríamos as seguinte mudanças:
  • Ao invés de que para cada 1000 crianças brancas fora da série adequada teríamos 1275 crianças negras ou pardas, teríamoscada 1000 crianças brancas fora da série adequada teríamos 1038 crianças negras ou pardas
  • Ao invés de que para cada 1000 pessoas brancas beneficiados pelo SUS teríamos 1424 pessoas negras ou pardas, teríamos para cada 1000 pessoas brancas beneficiados pelo SUS teríamos 1159 pessoas negras ou pardas
  • Ao invés de que para cada 1000 pessoas brancas não cobertas pelo SUS teríamos 1600 pessoas negras ou pardas
Isto mostra quão delicado é tomar estas estatísticas pelo valor de face sem estudar bastante o seu significado.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Dirigindo pelo Espelho Retrovisor

Samuel Taylor Coleridge tem uma frase muito boa:  "If men could learn from history, what lessons it might teach us! But passion and party blind our eyes, and the light which experience gives is a lantern on the stern, which shines only on the waves behind us!"

Traduzida livremente significa: Se o homem pudesse aprender com a história, que lições a mesma poderia nos ensinar! Mas a paixão e festa cegam nossos olhos, e a luz que a experiência provê é uma lanterna na popa, que somente brilha nas ondas que deixamos para trás.

Daí vem a expressão "Lanterna na Popa" para conceituar a experiência. A primeira vez que vi isto foi lendo a respeito da Biografia de Roberto Campos "Lanterna na Popa". A citação dá nome ao livro.

Eu não sou particularmente fã de Roberto Campos (ou mesmo de Samuel Coledrige), mas não posso deixar de notar a analogia com outra frase, cuja atribuição correta eu desconheço, mas que diz mais ou mesmo: "Confiar na experiência como guia é mais ou menos como dirigir para frente usando somente o espelho retrovisor"

A frase faz sentido pois se forçarmos a analogia, a experiência só permite enxergar a estrada por que passamos. Deste modo ela é realmente o olhar no espelho retrovisor. Agora imagine que você está usando somente o espelho retrovisor e não está dando ré (mas dirigindo para frente).

Isto é possível?

Bem, na realidade é possível. Mas são necessárias algumas condições para que seja realizável

Uma delas é que haja alguma espécie de sinalização prévia na estrada se há curvas à direita ou à esquerda. Naturalmente a sinalização tem que avisar previamente e ser fiel a como a estrada se comporta.

Implícito nessa premissa está o conhecimento do significado de cada elemento sinalizador.

Então talvez esse seja o papel da experiência: identificar o significado de cada elemento de sinalização como forma a seguir com tranqüilidade na estrada.

Muito bem, e o que isto tem a ver com o conteúdo deste blog?

Ah, a questão importante é sobre o conhecimento dos elementos de sinalização. Diferente das estradas normais, aonde os elementos de sinalização são conhecidos previamente, este é um caso em que o significado de cada elemento sinalizador precisa ser descoberto ao longo do caminho.

Complicado? Certamente, mas para tal serve a experiência anterior...

E mais motivo ainda para existência de crítica com as informações que são efetivamente repassadas.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Calote na Dívida Pública? E os Títulos da Dívida Pública?

Já devem ter ouvido a historinha que 20 mil famílias recebem o grosso dos dividendos da Dívida Pública, não?

Muito bem. Esta história é da economista Leda Paulani. O problema é aquele velho problema: toma-se a ideologia primeiro e depois a realidade (falácia da narrativa).

Você tem algum dinheiro em fundos de investimento? Então você também recebe algum dividendo da Dívida Pública. A verdade é que os bancos e os fundos de investimento é que são os maiores detentores de títulos da dívida pública:

"Os bancos e os fundos de investimento são os donos da maior parte dos títulos da dívida pública interna. Segundo levantamento inédito divulgado nesta terça-feira (22) pelo Tesouro Nacional, os bancos concentravam 35,4% da dívida interna em janeiro (R$ 536,03 bilhões) e os fundos respondiam por 31,3% (R$ 475,27 bilhões). 


Em terceiro lugar, estão os fundos de pensão, com 14,8% (R$ 224,48 bilhões). Os estrangeiros responderam por 12% (R$ 182 bilhões); e as seguradoras, por 4% (R$ 60,99 bilhões). Os demais investidores concentraram 2,5% (R$ 37,43 bilhões).


A participação de 12% dos investidores estrangeiros é recorde.Em valores absolutos, no entanto, a quantia diminuiu R$ 430 milhões em relação a dezembro. “O aumento percentual ocorreu porque o volume total da dívida interna caiu em janeiro”, ressaltou o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Fernando Garrido. A dívida pública mobiliária (em títulos) interna caiu de R$ 1,603 trilhão em dezembro para R$ 1,542 trilhão em janeiro."

Somando os investidores nacionais e estrangeiros temos 14.5% da dívida. Ou seja, bem diferente dos números que a historinha propaga. Mas é pior, pois a história já cruzou fronteiras.

"So in Brazil it is estimated that between 10,000 and 15,000 families receive the lion’s share of the $120 billion annual payments of the public debt (the cost of the Bolsa Família is $6-9 billion), while in the last decade millionaires have multiplied as never before. "

Claro que isto não é verdade, pela própria forma de composição da dívida: 35% Bancos, 31% Fundos de Investimento, 15% Fundos de Pensão, Seguradoras 4% e Investidores nacionais e estrangeiros 15%.

Naturalmente, o dinheiro que os bancos, fundos de investimento, fundos de pensão e seguradoras não são das empresas em si, mas das pessoas que são servidas por estas empresas.

Tem de ter muito cuidado com a falácia da narrativa: ela pode levar as pessoas a tomar decisões inacreditavelmente imbecis

Realengo e Bullying - Será mesmo?

Vi há poucos minutos este vídeo discutindo o Bullying como motivo para o massacre de Realengo.

Francamente?

Não creio que seja o caso. E existem algumas razões: a sanha assassina foi direcionada a um gênero em particular (feminino), os alvos não faziam parte dos "Bullyistas" originais, há uma tentativa de se entender o fenômenos desenvolvendo uma narrativa que tenha aparência de coerência.

O fato é que é temos uma tragédia cuja compreensão é difícil (para se dizer o mínimo, afinal foi causada por uma pessoa com indicações sérias de desequilíbrio), e da qual parece não haver proteção.

No fundo, as pessoas desejam encontrar algum tipo de explicação que satisfaça a necessidade de existir sentido naquilo tudo.

É algo comum a todos nós: é algo bastante humano.

Ironias e Crueldades

No dia 15/04/2011 tive notícia que o Ministério Público do Trabalho estima a demissão de 6 mil pessoas do canteiro de construção da Usina Elétrica de Jirau.

Qual é a razão? Bem, a reportagem fala:
"Na quinta-feira (14), o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, afirmou que as obras das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira, em Rondônia, teriam menos trabalhadores. O objetivo da medida seria garantir mais "tranquilidade na execução" das obras. O ministro explicou ainda que as empresas queriam antecipar o cronograma e por isso contrataram muitos trabalhadores, gerando dificuldades na administração da construção das usinas e conflitos nos canteiros de obra."

Mas eu queria focar na questão dos conflitos nos canteiros de obra.

Queria mostrar a ironia e a crueldade do desenvolvimento da situação, sob o governo de um partido intitulado de partido dos trabalhadores.

A revolta em si teve análises rasas, mas o fato é que ocorreram. E como resultado desta revolta trabalhista, o governo federal defendeu a redução na quantidade de trabalhadores. E o saco de maldades não parou por aí.

E esta notícia tem um grande poder educativo: eu não quero dizer que a ação do governo foi equivocada. Talvez tenha sido, talvez não tenha sido. Mas como ação de governo de um partido dos trabalhadores, ela envergonha e diminui todos aqueles que se filiaram a este partido dizendo defender os direitos trabalhistas.

A lição aqui é: "Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. E se fizer o que eu faço, eu ainda vou critica-lo por isso".

Então, quando encontrar pelas estradas da vida um filiado ao PT pergunte para ele como a ação do governo em Jirau o faz sentir? Ou melhor, pergunte para ele se ele aprova a ação do governo em Jirau?

Claro, se você for muito mau pode perguntar de  já não está na hora de crescer um pouco e admitir que o PT só defende trabalhador quando é do seu interesse?

quinta-feira, 14 de abril de 2011

A Falácia da Narrativa

Já tentaram dar uma aula ou palestra usando uma história como ponto central? Se tentaram devem ter notado que a presença de uma narrativa torna o tópico mais interessante para todos, mas fácil de ser acompanhado e compreendido. Em geral, estas são as aulas ou palestras mais interessantes.

E também mais fáceis de enganar as pessoas.

O problema é a falácia da narrativa, também conhecida como correlação ilusória. No caso é simplesmente a tendência (bastante humana) de montar nexos causais aonde não necessariamente existem.

Existem diversos casos na história e no dia-a-dia aonde a falácia da narrativa estão presentes. Um dos exemplos mais comuns é confundir evidência anedótica por regra geral. Outro é a alteração da história real para satisfazer um modo mais aprazível de contar a história ("Se non è vero, è ben trovato.").

Mas o fato é que isto é uma forma de auto-engano.

Felizmente existem ferramentas para verificar a veracidade de algumas dessas ligações lógicas. Uma das que eu considero melhor é o Teorema de Bayes (que já mencionei aqui diversas vezes). Efetivamente, ele faz a pergunta de qual é a probabilidade de tal evento dado que outro evento determinado ocorreu.

No caso da tragédia de Realengo, há diversos exemplos de falácias narrativas que podem ser encontrados na mídia. O que aliás pode até dar origem a exemplos de pânico moral (ou histeria de massas como também é conhecida). Mas no caso deste post vou me concentrar em outra questão: no alagamento da UnB.

Não vou questionar a versão que saiu na página da UnB pois não sou especialista na área e não tenho fatos para contrapor ao autor do artigo. Mas vou fazer uma ponderação: se um sistema de escoamento tem vazão Q quando está desentupido, Q/2 quando está parcialmente desentupido e Q/10 quando está entupido, então há de se considerar qual seria a vazão esperada com as probabilidades do sistema estar entupido.

Vamos considerar que quando há manutenção constante há 1 chance em 10 de se encontrar um bueiro parcialmente entupido e 1 chance em 100 de se encontrar um bueiro totalmente entupido.

Neste caso, teríamos uma vazão média: Q ((1-0.1-0.01)+0.1*0.5+0.01*0.1) = 0.941*Q (quase 95% de eficiência no geral).

Mas agora vamos considerar que a manutenção é menos do que estelar. Neste caso vamos considerar que a chance de encontrar um bueiro parcialmente entupido é 4 em cada 10 e a de um bueiro totalmente entupido é 1 em cada 10.


Neste caso, teríamos uma vazão média: Q (0.5+0.4*0.5+0.1*0.1) = 0.71*Q (quase 70% de eficiência no geral).

Por fim vamos considerar que a manutenção é rara. Neste caso vamos considerar que chance de encontrar um bueiro parcialmente é 7 em 10, e a de encontrar um bueiro totalmente entupido é de 2 em 10.

Neste caso, teríamos uma vazão média: Q (0.1+0.7*0.5+0.2*0.1) = 0.47*Q (quase 50% de eficiência no geral).

Então é possível ver que o entupimento pode ser facilmente uma causa que contribuiu para o alagamento.

Uma análise similar pode ser obtida através de Bayes com p(alagamento|bueiro entupido). Mas isto somente se estivermos interessados em entender as razões e não encontrarmos uma explicação baseada apenas na narrativa.

Não que a narrativa esteja errada. Apenas que ela pode não estar correta.

Populismo e Popularidade

Há muita confusão entre estas duas palavras. Para ser popular é preciso ser populista? Não creio, mas pela polêmica acerca do artigo de FHC parece que parte do país pensa que sim.

Para dar um pouco de perspectiva, transcrevo aqui o pedaço do artigo que gerou mais polêmica, julguem vocês mesmos:
Diante deste quadro, o que podem fazer as oposições? 

Definir o público a ser alcançado
Em primeiro lugar, não manter ilusões: é pouco o que os partidos podem fazer para que a voz de seus parlamentares alcance a sociedade. É preciso que as oposições se deem conta de que existe um público distinto do que se prende ao jogo político tradicional e ao que é mais atingido pelos mecanismos governamentais de difusão televisiva e midiática em geral. As oposições se baseiam em partidos não propriamente mobilizadores de massas. A definição de qual é o outro público a ser alcançado pelas oposições e como fazer para chegar até ele e ampliar a audiência crítica é fundamental. Enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT influência sobre os “movimentos sociais” ou o “povão”, isto é, sobre as massas carentes e pouco informadas, falarão sozinhos. Isto porque o governo “aparelhou”, cooptou com benesses e recursos as principais centrais sindicais e os movimentos organizados da sociedade civil e dispõe de mecanismos de concessão de benesses às massas carentes mais eficazes do que a palavra dos oposicionistas, além da influência que exerce na mídia com as verbas publicitárias. 

Sendo assim, dirão os céticos, as oposições estão perdidas, pois não atingem a maioria. Só que a realidade não é bem essa. Existe toda uma gama de classes médias, de novas classes possuidoras (empresários de novo tipo e mais jovens), de profissionais das atividades contemporâneas ligadas à TI (tecnologia da informação) e ao entretenimento, aos novos serviços espalhados pelo Brasil afora, às quais se soma o que vem sendo chamado sem muita precisão de “classe C” ou de nova classe média. Digo imprecisamente porque a definição de classe social não se limita às categorias de renda (a elas se somam educação, redes sociais de conexão, prestígio social, etc.), mas não para negar a extensão e a importância do fenômeno. Pois bem, a imensa maioria destes grupos – sem excluir as camadas de trabalhadores urbanos já integrados ao mercado capitalista – está ausente do jogo político-partidário, mas não desconectada das redes de internet, Facebook, YouTube, Twitter, etc. É a estes que as oposições devem dirigir suas mensagens prioritariamente, sobretudo no período entre as eleições, quando os partidos falam para si mesmo, no Congresso e nos governos. Se houver ousadia, os partidos de oposição podem organizar-se pelos meios eletrônicos, dando vida não a diretórios burocráticos, mas a debates verdadeiros sobre os temas de interesse dessas camadas. 

Mas não é só isso: as oposições precisam voltar às salas universitárias, às inúmeras redes de palestras e que se propagam pelo país afora e não devem, obviamente, desacreditar do papel da mídia tradicional: com toda a modernização tecnológica, sem a sanção derivada da confiabilidade, que só a tradição da grande mídia assegura, tampouco as mensagens, mesmo que difundidas, se transformam em marcas reconhecidas. Além da persistência e ampliação destas práticas, é preciso buscar novas formas de atuação para que a oposição esteja presente, ou pelo menos para que entenda e repercuta o que ocorre na sociedade. Há inúmeras organizações de bairro, um sem-número de grupos musicais e culturais nas periferias das grandes cidades, etc., organizações voluntárias de solidariedade e de protesto, redes de consumidores, ativistas do meio ambiente, e por aí vai, que atuam por conta própria. Dado o anacronismo das instituições político-partidárias, seria talvez pedir muito aos partidos que mergulhem na vida cotidiana e tenham ligações orgânicas com grupos que expressam as dificuldades e anseios do homem comum. Mas que pelo menos ouçam suas vozes e atuem em consonância com elas. 

Não deve existir uma separação radical entre o mundo da política e a vida cotidiana, nem muito menos entre valores e interesses práticos. No mundo interconectado de hoje, vê-se, por exemplo, o que ocorre com as revoluções no meio islâmico, movimentos protestatários irrompem sem uma ligação formal com a política tradicional. Talvez as discussões sobre os meandros do poder não interessem ao povo no dia-a-dia tanto quanto os efeitos devastadores das enchentes ou o sufoco de um trânsito que não anda nas grandes cidades. Mas, de repente, se dá um “curto-circuito” e o que parecia não ser “política” se politiza. Não foi o que ocorreu nas eleições de 1974 ou na campanha das “diretas já”? Nestes momentos, o pragmatismo de quem luta para sobreviver no dia-a-dia lidando com questões “concretas” se empolga com crenças e valores. O discurso, noutros termos, não pode ser apenas o institucional, tem de ser o do cotidiano, mas não desligado de valores. Obviamente em nosso caso, o de uma democracia, não estou pensando em movimentos contra a ordem política global, mas em aspirações que a própria sociedade gera e que os partidos precisam estar preparados para que, se não os tiverem suscitado por sua desconexão, possam senti-los e encaminhá-los na direção política desejada. 

Seria erro fatal imaginar, por exemplo, que o discurso “moralista” é coisa de elite à moda da antiga UDN. A corrupção continua a ter o repúdio não só das classes médias como de boa parte da população. Na última campanha eleitoral, o momento de maior crescimento da candidatura Serra e de aproximação aos resultados obtidos pela candidata governista foi quando veio à tona o “episódio Erenice”. Mas é preciso ter coragem de dar o nome aos bois e vincular a “falha moral” a seus resultados práticos, negativos para a população. Mais ainda: é preciso persistir, repetir a crítica, ao estilo do “beba Coca Cola” dos publicitários. Não se trata de dar-nos por satisfeitos, à moda de demonstrar um teorema e escrever “cqd”, como queríamos demonstrar. Seres humanos não atuam por motivos meramente racionais. Sem a teatralização que leve à emoção, a crítica – moralista ou outra qualquer – cai no vazio. Sem Roberto Jefferson não teria havido mensalão como fato político. 
Eu acho que o pessoal leu o que queria ler, e não o que estava escrito

quarta-feira, 13 de abril de 2011

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Como utilizar uma tragédia para alavancar interesses

Nesta semana tivemos a tragédia de Realengo. Não vou me alongar no crime, mas em como determinados grupos estão usando a tragédia para defender interesses que realmente tem pouca ou nenhuma relação na história.

Nas primeiras horas houve muita confusão a respeito. Talvez pela carta do atirador ser deveras estranha, algumas notícias tratavam mais de especulações mal informadas do que outra coisa. Devido às citações religiosas passou-se a pensar em crime por fanatismos (inicialmente muçulmano e depois cristão). A verdade é que a carta não diz isso. Há também menções sobre o amor que o atirador tinha por animais em oposição ao seu amor por seres humanos.

Não há menções sobre bullying, mas isto não impediu que diversos grupos utilizassem isto como bandeira. DE modo similar, há grupos que estão utilizando a tragédia para avançar a agenda do desarmamento (por vezes fazendo previsões mirabolantes). Mas o fato é que há indicações que as armas usadas são ilegais (o que atrapalha a idéia que desarmar a população iria evitar este tipo de crime).

A triste verdade é que estão usando uma tragédia para "venderem" um projeto político para população. Isso é spin, senhoras e senhores.... E não tem nada a ver com a verdade.

E aí que mora o problema...

Há duas questões aqui. E para ambas é necessário ter muito sangue frio para ter uma análise racional. A primeira delas é que este tipo de crime é muito raro. Muito raro mesmo. Aqui vemos uma lista com incidentes de tiroteios em Escolas. De  1966 até 2011 tivemos 109 incidentes com um total de 229 mortes. Só em 2009 tivemos 9146 homicídios por armas. Em 2009, o número de incidentes em escolas foram 10 e o número de mortos foram 7. Isto dá 1 caso em 1306 (ou seja 99.92% dos casos não são de tiroteios em escolas). Então, este crime é bastante raro...

O segundo ponto é que para evitarmos que eventos como este aconteçam temos, antes de mais nada, saber porque eles acontecem. Sem conhecer as causas do problema é EXTREMAMENTE  difícil resolve-lo (basicamente é apostar na sorte). E na questão de Realengo, o risco é que a agenda política se sobreponha a esta demanda.

E aí a coisa pode ficar realmente muito feia mesmo...

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Quando os ex-amigos viram inimigos

Eu leio com frequência a coluna de um blogueiro (que eu considerava um excelente jornalista alguns anos atrás). Este blogueiro foi um dos primeiros a cunhar o termo PiG (Partido da imprensa Golpista), que eu jocosamente defino como a contrapartida do PIG (Partido da Imprensa Governista).

Não quero entrar no mérito da pessoa, preferências ou seus trabalhos (apesar de ter uma opinião a respeito, devo dizer que considero a mesma um tanto polarizada). Dizendo isto quero ressaltar como é dura a vida dos bate-palmas-para-o-governo.

Um dia os inimigos são claros: todos aqueles que querem retirar o governo apoiado pelo PIG. Ou seja, todos que estão alinhados com as opinões expressas no PiG.

No outro dia, os ex-aliados passar a criticar o governo, enquanto o antigo PiG elogia o governo. Caso em questão? Belo Monte! Os que criticam eram do PIG e os que elogiam eram do PiG.

O que fazer? Duplipensar! Chama-se o antigo PIG de PiG e espera-se que ninguém perceba as cenas explícitas de puxa-saquismo chapa branca.

Realmente é triste a sina dos bate-palmas-para-o-governo. Destruindo reputações a cada post, especialmente a própria reputação.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Andar de Carro é mais caro do que de Taxi?

Para começar é possível saber algo mais sobre o custo de uma corrida de Taxi. Então de posse desses valores podemos chegar a alguns números interessantes.

No caso de Brasília, ao entrar no Taxi você paga R$ 3,30 e para cada quilômetro rodado paga-se R$ 1,80 (Bandeira 1) e R$ 2,28 (Bandeira 2). Se supormos um trajeto do tipo Casa-Trabalho-Casa todos os dias (os finais de semana poderia ser (Casa-Diversão-Casa), então temos R$ 6,60/dia somente para entrar no Taxi. No meu caso, isto corresponde a um custo de 2 vezes R$ 24,57 (Bandeira 1) ou 2 vezes R$ 30,24 (Bandeira 2) por dia.

Para arredondar, vamos dizer que o gasto seria de R$ 50,00/dia. Ao longo de 365 dias isto daria R$ 18.250,00 por ano. Isto é quase o preço de um carro popular.

Então carro é mais barato, certo? Não é tão simples. O uso do carro envolve não só o preço de compra do veículo, mas custos adicionais (combustível, estacionamento, manutenção). Em contas simples, ao longo de 7 anos (neste blog tem alguns detalhes) o custo do carro é praticamente o dobro do valor de compra.

Então pode realmente ser um caso a se pensar.

No meu caso, como não tenho pressa em trocar de carro, o custo ainda não compensa. Mas se começarem a cobrar estacionamento a história pode ser outra.

Ilusão da Gratuidade

Já esclareço: Não existe nada de graça. A gratuidade é uma ilusão, pois no fim alguém sempre acaba pagando pelo "gratuito".

Serviço Público Gratuito de Saúde? Não é gratuito! O seu custo está lá embutido nos impostos pagos. Serviço Público de Transporte Gratuito? Não é gratuito! Também está lá embutido nos impostos. Segurança alimentar? Bolsas? Ensino Público?

Tudo isto está embutido nos impostos.

Então cabe uma lição aqui: quando se fala em cortar impostos, se fala em cortar estes serviços. Ah, já vejo os protestos: "Mas basta acabar com a corrupção que pode cortar impostos!"

Sim, basta acabar com a corrupção que podemos DIMINUIR impostos (não cortá-los) e manter estes serviços. E aí vejo dois problemas:

  1. Acabar com a corrupção - como um amigo meu já me disse: "Sério Cara? Por que ninguém pensou nisso antes?". Em outras palavras, esta é uma tarefa mais simples de falar do que fazer. Há indícios assustadores que a corrupção tende a piorar com o tamanho da estrutura necessária para administrar um determinado serviço. E serviços com um larga base de usuários tendem a ser naturalmente grandes.
  2. Cortar impostos - cortar impostos significa simplesmente diminuir o escopo de atuação dos serviços. Sim, é possível se fazer mais com menos, mas de novo existem limites. Aumentar a eficiência de novo bate nos limites do 100%. Não dá para passar disso (quem diz dar 110% de si para o trabalho claramente não aprendeu o que significa percentagem).

Então no fundo: sempre tem um pagador para o serviço. O argumento da gratuidade é no fundo um pega-trouxa (afinal quem não quer receber sem ter dar alguma contrapartida?).

A pergunta que deve ser feita é: esta é a melhor forma de fazer? Bem, aí temos respostas não muito claras. Originalmente o Estado tende ser um árbitro pior em média do que uma pessoa. No entanto, não é possível afirmar que o Estado é um árbitro pior em média do que uma pessoa em média. A sutileza do raciocínio é a seguinte: como as pessoas podem tomar decisões boas ou ruins, o comportamento médio destas decisões boas e ruins não pode ser afirmado como melhor que o arbítrio médio do Estado.

O que se pode afirmar é que há situações aonde a pessoa é melhor árbitro em média e há situações aonde o Estado é melhor árbitro em média. O senso comum é que pessoas esclarecidas e educadas podem tomar decisões melhores em média do que o Estado em média. Infelizmente mesmo esta afirmação pode não ser comprovada integralmente.

Mas existem situações aonde faz mais sentido que indivíduos sejam responsáveis pelo custo, ao invés da população inteira ser responsável pelo mesmo. Estas situações ocorrem aonde nem todos usufruem do serviço diretamente (o imposto de estradas e rodagem é um caso assim - se for usado para estradas e rodagem). Neste caso, o custo de uma estrada não é rateado apenas entre seus usuários mas todo o universo pagante de impostos.

Pode-se argumentar que na realidade este método elimina mais uma componente no preço de venda de mercadorias (devido ao transporte). Mas o que ele faz é mudar as condições de custo para mercadorias próximas e distantes (tornando as mais distantes ligeiramente mais competitivas).

Então, de graça? Nem injeção na testa!

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Calaboca Bolsonaro? E como fica a liberdade de expressão?

Esta é a grande questão: como podemos defender a liberdade de expressão e proibir alguém de expressar alguma coisa?

Ehhh... Não dá! Ah, mas há iluminados que dizem que a liberdade de expressão não pode servir para algo que é moralmente repreensível. Será que este pessoal já viu The People vs Larry Flint? Ali tinhamos algo que poderia ser considerado moralmente repreensível, e aí?

O problema da liberdade de expressão é justamente o de garantir o direito de alguém expressar algo que você detesta intimamente com todas as forças. Este é o verdadeiro teste.

E claro que limitar a liberdade de expressão e decidir na existência de crime de idéias ou palavras está no mesmo saco. Ao limitarmos a liberdade de expressão estamos definindo uma nova categoria de crimes: crimes de pensamento.

É desnecessário dizer que esta estrada é longa, escorregadia e particularmente perigosa.

E claro, você sabem de onde vem o termo crime de pensamento, não? Talvez o termo em inglês seja mais familiar:

Thoughtcrime

domingo, 3 de abril de 2011

3 anos da Invasão da Reitoria da UnB

Hoje estão fazendo 3 anos da invasão da reitoria da UnB. Foi bom? Foi ruim? Deixo para cada um tomar esta decisão.

Temos aqui uma reportagem da Folha:

O cheiro quase insuportável que emanava dos banheiros do gabinete do reitor da UnB (Universidade de Brasília) e a luz só de velas não desanimaram os cerca de 80 estudantes-invasores que decidiram passar a noite no local. Eles invadiram anteontem o gabinete do reitor Timothy Mulholland, por volta das 14h30, pedindo a saída dele e de seu vice, Edgar Mamya.
Folha acompanhou as 18 primeiras horas da invasão, ao lado dos estudantes. Às 8h20 de ontem, foi convidada a se retirar. Durante a noite, foi possível identificar o cheiro de maconha no local.
O espaço foi informalmente dividido em quatro grandes ambientes e algumas áreas mais reservadas. Na entrada, o grupo dos rapazes "mais fortes" se concentrava em vigiar a porta e evitar uma possível entrada da polícia. Eles se revezaram em turnos e dormiram pelo chão.


Naturalmente, a situação não simplificou:

A PF (Polícia Federal) informou que está negociando a saída pacífica dos estudantes que ocupam desde quinta-feira passada (03) o prédio da reitoria da (Universidade de Brasília). A 17ª Vara da Justiça Federal do DF determinou na sexta-feira que os estudantes desocupassem o gabinete do reitor Timothy Mulholland.
Os estudantes não só descumpriram a decisão da Justiça como decidiram manter e ampliar a ocupação, em assembléia realizada ontem. Representantes do DCE (Diretório Central dos Estudantes) informaram que iriam recorrer da decisão na Justiça. A ocupação foi estendida para cinco andares do prédio da reitoria.


Mesmo o reitor acenou com propostas para satisfazer os estudantes:

O reitor da UnB (Universidade de Brasília), Timothy Mulholland, disse hoje que pretende atender parte das reivindicações feitas dos estudantes da instituição. Um grupo de 200 alunos invadiu na quinta-feira passada o gabinete do reitor. A ocupação foi ampliada ontem e agora atinge os cinco andares da reitoria.
"A reitoria está mostrando um esforço grande para chegar até eles. Queremos trabalhar juntos na coletividade que se busca caminhos e se amadurece soluções", diz Mulholland.
Entre as reivindicações que Mulholland diz que serão atendidas estão a ampliação da universidade, aumento do número de professores, reforma da Casa do Estudante, construção de prédios da UnB em duas cidades-satélites, revisão da relação das fundações com UnB, reexame da escolha do reitor e aumento de vaga para bolsistas.


Mesmo o senador Cristovam pediu ao reitor que se afastasse temporariamente do cargo:

O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) sugeriu hoje que o reitor da UnB (Universidade de Brasília), Timothy Mulholland, peça licença do cargo para evitar que os estudantes acampados na reitoria da universidade sejam retirados, a força, pela Polícia Federal. Cristovam teme que a decisão dos estudantes de permanecerem na reitoria, mesmo após o fim do prazo estipulado pela PF para que deixem o local, transforme a UnB em palco de violência.
Do plenário do Senado, Cristovam fez o apelo para que o reitor apenas se afaste temporariamente do cargo porque disse acreditar que a renúncia está descartada por Mulholland. Por outro lado, reconheceu que os estudantes também não estão dispostos a desocuparem o prédio se o reitor permanecer no cargo.


Pouco lembrado é o fato que a SECOM soltou uma nota a respeito:

1 – O movimento dos estudantes foi influenciado e teve participação direta de professores da instituição, ligados ao movimento sindical e partidário, que incitaram a invasão;
2 – Durante a invasão da Reitoria, os estudantes arrombaram e quebraram uma porta e outros itens do gabinete;
3 – O afastamento do Reitor e do Vice-reitor de seus cargos e funções não é ponto de negociação. A administração foi eleita legitima e democraticamente pela votação mais expressiva da história da instituição. O Reitor tem mandato de quatro anos, que se encerra em novembro de 2009, nomeado pelo Presidente da República. Além disso, não é réu e nem sequer tem qualquer processo contra sua pessoa;
4 – A Reitoria da UnB tem total disposição para dialogar com os estudantes, mas demanda que os espaços ocupados sejam liberados. A manutenção dos manifestantes nos ambientes administrativos prejudica o andamento de processos da universidade, inclusive aqueles que dizem respeito aos próprios estudantes, como a definição de recursos para a assistência estudantil e a reforma da Casa do Estudante Universitário, processos esses que têm prazos definidos para a utilização de recursos;
5 – A Reitoria da UnB tem uma equipe designada para a negociação com os estudantes e espera colaboração dos alunos invasores para que se consiga a melhor solução possível para o impasse.


O final todos sabemos:

O reitor da UnB (Universidade de Brasília), Timothy Mulholland, renunciou ao cargo. O pedido de exoneração será encaminhado ao Ministério da Educação. Ele estava afastado desde quinta-feira pelo prazo de 60 dias. A diretoria da UnB e o ministro da Educação, Fernando Haddad, discutem a substituição.
Na reunião também será discutida a posição a ser tomada em relação à ocupação dos estudantes na reitoria. Os estudantes da universidade, que ocupam a reitoria desde o último dia 3, não devem participar do encontro.


O que foi certo e o que foi errado? O que foi conquistado?

Quais as conseqüências de tudo isso?