quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Sobre o preço de uma ação – Parte I

Antes de sairmos por aí tentando precificar ações na bolsa sem sabermos direito o que isso significa, precisamos entender exatamente onde estamos nos metendo.

E para tanto temos que entender o que é a bolsa e como funciona.

Então temos que simplificar ao máximo o que está acontecendo em um mercado de ações sem perder noção dos mecanismos envolvidos. Então o que vou explicar é verdade, mas é uma versão bem simplificada da verdade (que funciona e pode ser usada, mas ainda é simplificada).

A ideia do mercado de ações é exatamente o que o nome diz: um mercado onde se compram e vendem ações. Nesse ponto não é muito complicado, mas a história começa a se complicar rapidamente. Vamos pensar por enquanto nas ações como uma mercadoria qualquer, como pão, sapatos ou um carro.

Em primeiro lugar, porque uma pessoa compra ou vende uma mercadoria? Bom, estritamente a pessoa deve achar que vale a pena fazer essa operação. E assim vamos a duas simplificações:

·         A pessoa vende a mercadoria quanto o preço ofertado é maior ou igual ao valor que esta pessoa acredita que a mercadoria possui. Esta pessoa está disposta a trocar posse da mercadoria  por um valor monetário.

·         A pessoa compra a mercadoria quanto o preço ofertado é menor ou igual ao valor que esta pessoa acredita que a mercadoria possui. Esta pessoa está disposta a trocar um valor monetário pela posse da mercadoria.

Aqui a coisa começa a complicar, pois apesar de todo mundo fazer isso todo dia, determinar o preço das coisas não é algo tão simples assim. Note que que a troca seja realizada a mercadoria TEM DE ESTAR em um preço que o comprador e vendedor concordem (há a questão que a ação é comprada ou vendida através de uma lista de compra, mas vamos ver isso depois).

Nisso tudo, o preço é a representação do valor dado a mercadoria, Note que preço não é o valor, mas a representação (assim como um cardápio é uma representação da comida no restaurante e não a comida em si). E este é o cerne da maior parte das questões do mercado de ações: o preço está justo ou não? (O pessoal da área costuma chamar isso de valuation).

A ação na bolsa nada mais é que uma fração do valor da empresa, quem tem todas ações efetivamente é dono da empresa. Então o preço da ação é apenas uma fração do preço real da empresa. Em um exemplo simplificado: uma empresa de um milhão de reais com um milhão de ações tem o preço por ação igual a um real. Em uma versão simplificada, se o vendedor quiser vender a ação o preço de venda justo é R$ 1,00. Do ponto de vista do nosso modelo simplificado, este valor é :

Olhando a equação temos que o valor percebido  varia no tempo. Isso é por vários motivos, sendo um deles que a percepção do valor da companhia varia de acordo com o que os interessados acreditam que ela vale. Naturalmente, isso vai estar relacionado com a saúde financeira da empresa, da fatia do mercado que empresa ocupa e das perspectivas de crescimento da empresa. Mas também existem fatores dentro da dinâmica da compra e venda de ações.

Eu havia mencionado antes que as ações são vendidas e compradas em uma lista. Pois é, tanto a compra como a venda são realizadas em um sistema similar a leilões. Há uma lista de ações com preços distintos e a compra e venda são realizadas nessas listas. Como exemplo vamos dizer que a ação de uma determinada companhia tenha a seguinte lista de compra e venda:

Preço (Venda)

Quantidade (Venda)

Preço (Compra)

Quantidade (Compra)

1,00

2

1,01

3

1,01

2

1,02

4

1,02

2

1,03

1

1,03

4

1,04

0

1,04

0

1,05

2

Isso quer dizer que se você quiser vender uma ação (colunas preço (venda) e quantidade (venda)):

·         Temos 2 compradores dispostos a pagar R$ 1,00 por ação

·         Temos 2 compradores dispostos a pagar R$ 1,01 por ação

·         Temos 2 compradores dispostos a pagar R$ 1,02 por ação

·         Temos 4 compradores dispostos a pagar R$ 1,03 por ação

·         Não temos compradores dispostos a pagar mais do que o último valor

Já se você quiser comprar uma ação (colunas preço (compra) e quantidade (compra)):

·         Temos 3 vendedores dispostos a vender uma ação por R$ 1,01

·         Temos 4 vendedores dispostos a vender uma ação por R$ 1,02

·         Temos 1 vendedor disposto a vender uma ação por R$ 1,03

·         Não temos vendedores dispostos a vender uma ação por R$ 1,04

·         Temos 2 vendedores dispostos a vender uma ação por R$ 1,05

Vamos fazer um exemplo e dizer que você compra 10 ações, e com isso paga:

 O preço por ação é 10,24 e esse será o último preço registrado como preço da ação. No entanto se você quiser vender estas ações que comprou, o preço será o registrado na tabela da venda, ou seja:

E esse será registrado como o novo preço da ação. Note que isso tem a ver com os interesses de compra  venda da ação.

A existência dessa tabela implica que o valor (ou percepção do valor) da empresa  varia no tempo em função das quantidades de compras e vendas. Ou seja, a própria tabela implica em uma variância no preço da ação. E além disso a ideia é que empresa tenha cresça e renda para quem colocou dinheiro nela. Ninguém vai comprar uma participação em uma empresa se esta não render algo.

E aí que a coisa complica... Qual é o valor da empresa em determinado instante do tempo? Aí entram vários fatores para se chegar em um número, que pode ou não ser correto. Geralmente estamos em um determinado instante k e queremos saber se vale a pena comprar ou vender determinada ação. Isso, em última análise, implica em estimar o valor futuro da ação. E estimar o futuro é uma coisa complicada. 

Mas sabemos algumas coisas relevantes adicionais: a inflação e a taxa de juros.

Não faz sentido investir dinheiro em uma ação que valorize menos do que a taxa de retorno sem risco (taxa de juros). E naturalmente também não vale a pena investir em algo que perde para inflação. Vamos ver mais sobre isso em um post futuro.

sexta-feira, 21 de novembro de 2025

Problemas no Modelo

Nas suposições que usamos para derivar a distribuição log-normal de probabilidade do retorno, duas delas são muito fortes e podem causar problemas: invariância temporal da média e do desvio padrão. A suposição é que o modelo pode ser usado em situações de calmaria onde tanto a média quanto o desvio não variam muito com o tempo. Mas quão realista é essa suposição? Uma forma de verificar é utilizando médias móveis, ou médias com tamanho variável. E para tanto vamos considerar a nossa carteira de ações (Vivo, TIM, Banco do Brasil e Itaú) com médias com número de amostras diferentes:

Números de Amostras

TIM

(média)

VIVO

(média)

Banco do Brasil

(média)

Itaú

(média)

95

0,001122

0,000718

0,000547

0,001047

85

0,002041

0,000894

0,001324

0,00132

75

0,002818

0,000933

0,002211

0,001982

65

0,001703

0,000252

0,002441

0,001606

55

0,001295

-0,00013

0,001794

0,001307

45

0,002108

0,000159

0,000954

0,001507

35

0,002278

0,00059

0,001835

0,001668

 









E o que vemos é que a média calculada varia bastante (mais de 100%) em todos os casos. Curiosamente, o mesmo não pode ser dito a respeito do desvio padrão:

Números de Amostras

TIM

(desvio)

VIVO

(desvio)

Banco do Brasil

(desvio)

Itaú

(desvio)

95

0,012072

0,012292

0,017994

0,011569

85

0,011639

0,012118

0,018499

0,011291

75

0,011735

0,012218

0,019074

0,010721

65

0,010346

0,012707

0,017771

0,011079

55

0,011024

0,013329

0,014498

0,008771

45

0,011556

0,014401

0,012667

0,009195

35

0,012637

0,015705

0,011830

0,008984

 









Isto é um indicador que a componente aleatória (de média zero) não se altera muito com o tempo, sendo que a componente que determina a média é que se altera bastante com o tempo. Se olharmos a mediana após um intervalo de tempo k:

Isso pode ser visto em um gráfico da densidade de probabilidade.

Densidade de Probabilidade obtida a partir de médias com números de amostras diferentes

Na figura temos a densidade de probabilidade calculada de amostras até o dia 10/11/2025 projetada para o dia 21/11/2025 (hoje). O valor da ação em 10/11 era de R$ 24,58 e o valor da ação no dia 21/11 é de R$ 24,71. Vamos ver o que o modelo diz com diferentes tamanhos de amostra.

Números de Amostras

Retorno mediana

Retorno Esperado

95

24.8295

24.8458

85

25.0357

25.0509

75

25.2114

25.2270

65

24.9596

24.9717

55

24.8682

24.8818

 

Neste caso todos os retornos esperados superestimaram o valor da ação. Mas todos eles estão dentro do intervalo de confiança de 90%.

Números de Amostras

Intervalo de confiança de 90%

95

23.3936   26.3535

85

23.6383   26.5157

75

23.7929   26.7144

65

23.7174   26.2670

55

23.5515   26.2584

 

E observando a série temporal tivemos variações entre R$ 24,19 e R$ 25,11 nesse período (9 dias úteis).

Podemos inferir que a variação temporal da média calculada reflete a variação temporal que o mercado dá ao valor da empresa (e da ação). Então para melhorar o modelo temos de levar em conta essa percepção de valorização que a empresa tem. E para isso precisaríamos de uma outra maneira de decidir sobre o valor da ação da empresa. E isso é assunto para outro post.